A questão levantada neste post não é, sequer, uma questão
debatida entre os filósofos, uma vez que se trata de uma falsa questão. Ainda
assim, é uma questão que surge algumas vezes entre quem ensina filosofia no
ensino secundário.
Praticamente todos os filósofos ou criaram o seu sistema lógico,
ou usaram algum sistema lógico, desde Aristóteles, Leibniz, Heidegger, Husserl
ou Plantinga. Claro que nem todos desenvolveram a lógica como Aristótles, Frege
ou Kripke, mas todos, sem excepção, utilizaram conhecimentos de lógica para
desenvolverem os seus sistemas filosóficos.
É uma falsa questão pois a filosofia não foi nunca reduzida à
lógica, nem pelos filósofos, nem nos manuais de filosofia. Há certamente muitos
modos de expressão filosófica já que a filosofia expressa-se na linguagem
usada. E a linguagem é sujeita a múltiplos factores que não só a lógica. Assim,
só mesmo o estudo da lógica se reduz à lógica e somente os estudos dos lógicos
estão reduzidos (pelo menos de uma forma explícita) à lógica.
Uma parte significativa da obra de Aristóteles é de lógica.
Será que Aristóteles reduziu a sua filosofia à lógica?
Outra questão que quem defende esta falsa ideia tem de
responder é a seguinte: mesmo que fosse verdade que a filosofia se reduz à
lógica, que alternativa é proposta? A que é que a filosofia se deve reduzir? Ou
não se deve reduzir a nada e tudo vale? Se fosse verdade que a filosofia não
tem de ter qualquer restrição intelectual (considerando erradamente que a
lógica restringe intelectualmente) e que qualquer metodologia pode ser
filosófica, então, temos de aceitar que uma filosofia que fosse reduzida à
lógica (e não existe tal coisa) seria tão filosófica como uma filosofia que não
se reduzisse à lógica para se reduzir a qualquer outra coisa.
O erro da proposição “a filosofia não se deve reduzir à
lógica” percebe-se quando questionamos quem defende esta ideia, sobre então a
que se deve reduzir a filosofia. Em regra a resposta (quando há) é vaga e pouco
dignificante da filosofia. Isto acontece porque na base a afirmação é errada.
A explicação
A lógica é usada filosoficamente (pelo menos desde
Aristóteles) para ampliar intelectualmente a capacidade da argumentação
filosófica. Tal como um biólogo usa o microscópio. Pode-se fazer investigação
em biologia sem o microscópio? Creio que não falharei se afirmar que sim, que
pode. E pode até chegar-se a insights
brilhantes fazendo biologia sem recorrer ao microscópio. Daí não se segue que
quem usa o microscópio esteja a reduzir a biologia ao microscópio. Tal seria
como pensar que quando se vai para uma aula de biologia se vai estudar o
microscópio, que ele seja o objecto de estudo da biologia. Claro que isto seria
um disparate. Mas não será em lugar algum disparatado se o microscópio for
usado para ajudar os estudantes a ver melhor a realidade da vida e dos
organismos observados. Ajuda? Quem o nega?
Assim, quem afirma que “a
filosofia não se reduz à lógica” não está a dizer nada de novo. Seria
como dizer que “ a biologia não se reduz ao microscópio”. Sim, qualquer biólogo
e estudante atento compreende isso sem grande esforço. Mas também não se reduz
aos tubos de ensaio, nem à classificação das espécies ou organismos, etc… mas
não falamos certamente de biologia se não soubermos usar todas essas
ferramentas em laboratório.
Em igual modo, a filosofia não se reduz nem à lógica, nem à língua
francesa, inglesa ou alemã, nem ao facto de se ser homem ou mulher, ou de se
pertencer à universidade X ou Y. Com efeito ninguém pode negar que é necessário
saber lógica para compreender bem filosofia, que é necessário saber ler em
inglês para saber ler o que se vai publicando na filosofia mais avançada que se
faz nos nossos dias e que é preciso ter a sorte de frequentar uma boa
universidade para ter uma boa formação em filosofia.
E já agora: a matemática também não se reduz aos números. Para
se saber fazer matemática são necessárias outras condições, como saber
raciocinar e calcular, ter saúde, etc… pode-se ensinar matemática sem números?
Na minha opinião, sim. No entanto, os números parecem ser uma linguagem
adequada para ensinar a raciocinar matematicamente.
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