Mostrar mensagens com a etiqueta Filosofia política. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Filosofia política. Mostrar todas as mensagens

domingo, 25 de maio de 2025

Uma aula de filosofia política - John Rawls e as objeções

 Ocasionalmente vou gravando aulas para    os meus alunos reverem os conteúdos. Esta sobre filosofia política tem já 2 anos e estava a aguardar uma edição melhor. Resolvi publicar mesmo assim enquanto não edito novamente uma outra. Os materiais de suporte são uma compilação de outros trabalhos e seguem as Aprendizagens Essenciais. Espero que seja uma aula útil especialmente aos alunos que vão realizar exame de filosofia. 




quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Comunitarismo

O comunitarismo é uma teoria da filosofia política que agora aparece para lecionação como obrigatória em resposta ao liberalismo de John Rawls no 10º ano. E é uma teoria bem interessante. Existe um comunitarismo mais progressista e outro mais conservador. Como introdução geral e dado o escasso tempo para preparar as aulas, recomendo esta introdução do Dicionário de Filosofa Moral e  Política do Instituto de Filosofia e Linguagem da FCSH, UNL.

ACEDER AQUI AO ARTIGO



segunda-feira, 14 de maio de 2018

Desigualdades

Hoje mesmo a imprensa em Portugal noticiava que os gestores de empresas ganham muito mais que os trabalhadores base. Harry Frankfurt apresenta neste livrinho, publicado na Gradiva, um excelente argumento para justificar a desigualdade que não necessariamente esta desigualdade que as notícias revelam. 

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Será moralmente aceitável cobrar mais impostos ao que ganha o Ronaldo?

Cristiano Ronaldo assinou novo contrato com o Real Madrid, o seu clube. Passa a ganhar cerca de 2 milhões de euros de salário por ano. Será moralmente justo? Deve o Estado intervir e cobrar mais impostos ao vencimento do Ronaldo para equilibrar a redistribuição da riqueza? Se o Ronaldo não é totalmente responsável pelo seu talento (pode ser hereditário) será justo ganhar mais que todos os outros que não podem competir pela lotaria da natureza em igualdade de circunstâncias? Vale a pena aproveitar a ocasião e perder 30 minutos a ver esta aula de Harvard com o professor e filósofo Michael Sandel. (se as legendas não arrancarem podem ser ativas no menú em definições)


sexta-feira, 10 de junho de 2016

Capitalismo ou Socialismo? Qual o melhor ismo?

Qual a forma mais justa para distribuir os bens numa determinada sociedade? Será o socialismo uma boa resposta? Ou o capitalismo responde de forma mais eficaz ao problema? As respostas a este problema de filosofia política são ensaiadas nestes belíssimos livros da secção Política da Filosofia Aberta da Gradiva, publicados este ano.



domingo, 13 de setembro de 2015

Refugiados, aceitá-los ou não? Pequeno contributo para uma discussão viável


Sobre o problema do acolhimento de refugiados de guerra

O problema mais discutido neste momento nas redes sociais é o dos refugiados. Neste pequeno post vou tentar dar algumas pistas aos mais novos para organizarem uma discussão, usando este problema como exemplo, poupando-me ao esforço de explicar qual é o problema pressupondo que é conhecido por todos. Há várias questões que se colocam com o problema dos refugiados. Aqui vou usar somente uma entre todas as outras questões que se podem levantar.

Problema: Queremos saber se devemos ou não aceitar refugiados na europa e, mais concretamente, no nosso país.

Como resposta ao problema fiz um levantamento dos argumentos mais utilizados na imprensa e redes sociais e que sintetizei neste quadro:

Sim, devemos acolher os refugiados
Não, não devemos acolher os refugiados
    ·         Temos obrigação moral de proteger os que fogem da guerra e sofrimento
   ·         Há princípios políticos registados em convenções que nos obrigam a acolher refugiados de guerra
    ·         Os refugiados não são responsáveis pela guerra e pelo que sucede no país deles
   ·         Quem não aceita o acolhimento de refugiados é xenófobo e racista
   ·         Os refugiados constituem uma ameaça pois vem de uma cultura terrorista e de violência
   ·         Os refugiados não aceitam a cultura dos países de acolhimento
  ·         Estamos numa situação de crise e primeiro devemos ajudar os nossos e somente após os outros

É difícil estabelecer quando o problema começa a ser moral e deixa de ser político, ou começa a ser social ou mesmo psicológico. Todos estes campos de leitura se misturam e tomei-os aqui como um todo, embora reconheça que torna a discussão menos clara. Quando perguntamos se temos a obrigação de acolher refugiados, temos de questionar se essa obrigação é moral, política ou outra. Isto é importante pois alguém pode defender que temos a obrigação moral de os acolher, mas não política. Ou o contrário, por respeito a determinadas convenções políticas temos a obrigação política de os acolher, mas não temos moralmente de o fazer. Mesmo alertando para esta confusão, vale sempre a pena dar algum caminho à discussão.
O espaço deste post não pretende analisar exaustivamente cada um dos principais argumentos apresentados. Há muitos mais, mas estes parecem ser os mais representativos segundo a minha experiência subjetiva de leitura). Vou pegar apenas em cada um dos argumentos e tentar mostrar onde podem acertar e falhar. Assim, na parte do “Sim”, pego no argumento que defende:

O Sim
 “Quem não aceita o acolhimento de refugiados é xenófobo e racista”.

O argumento pode ser formalizado logicamente de modos muito diferentes, o que o torna mais complexo. Isto acontece pois pode-se invocar razões diferentes para esta mesma conclusão. No entanto se a forma de um argumento não for explicitada, não o conseguimos discutir. Vale então a pena o esforço de mostrar a sua forma. Quem quiser mostrar a sua forma deve fazer apenas a seguinte pergunta: o que é que me leva a defender isto? Defender sem razões é conversa vazia, o que queremos evitar. Vamos supor que alguém defende esta posição com base nestas premissas:

(P1) Se não aceitar os refugiados então é xenófobo
(P2) E não aceita os refugiados
(c) Logo, é xenófobo

A forma do argumento ainda assim dá uma ideia vaga do que se está a defender, mas pelo menos temos de saber explicar a primeira premissa. Será ela uma premissa verdadeira ou falsa? A verdade ou falsidade da premissa será determinante para o argumento ser bom ou mau, mesmo que ele seja válido. Para saber avaliar a premissa temos de saber as razões pelas quais alguém não aceita o acolhimento dos refugiados e por isso aqui, parece, o «ónus da prova» teria de recair sobre os argumentos do lado do “Não”.
Mas há aqui um aspeto a considerar também. Ser xenófobo é uma coisa boa ou má? E se é má é sempre má? É claro que de uma forma geral ser xenófobo é algo mau, pelo menos moralmente, mas não é difícil encontrar pequenos contra exemplos em que ser xenófobo até pode ter bons resultados. Se avaliarmos uma ação pelas suas consequências, pelo menos temos de admitir essa possibilidade. O que aqui recomendo que se evite é limitar a discussão apenas pelo recurso à acusação, pois já que ela tem uma conotação bastante negativa, em regra, mesmo quem assume posições xenófobas, recusa ser xenófobo, um pouco como o princípio de que “não sou racista pois os ciganos não são uma raça”. O que quero mostrar para o proveito da discussão é que se as posições forem xenófobas as pessoas devem assumir que o são, sem com isso recusar os argumentos, mesmo que discordemos deles. Um argumento pode ser xenófobo e ser um bom argumento. Ou mau. Ou seja, a qualidade do argumento não tem que ver com o ser ou não xenófobo. Vamos supor que era verdade que todos os refugiados são terroristas. Nesse caso ser xenófobo rejeitando o seu acolhimento podia ser uma coisa correta a fazer. Não teríamos de acolher uma comunidade de terroristas que ameaça o bem-estar da nossa comunidade só por não querermos ser xenófobos.

O Não

Vamos agora analisar, ainda que brevemente, um argumento de quem defende o “Não”.

·         “Os refugiados constituem uma ameaça pois vem de uma cultura terrorista e de violência.”

Parece que aqui há contra exemplos evidentes a este argumento. Os próprios europeus já estiveram no século xx nesta situação de refugiados. Só para citar um exemplo entre centenas senão milhares, Einstein foi para os EUA porque era judeu*. Segundo li numa das suas biografias quando chegou a Princeton o salário oferecido era de longe superior ao esperado. Os EUA têm hoje dos centros universitários mais sofisticados do mundo. Mas eram moribundos antes da segunda grande guerra. E podem agradecer ao nazismo e à guerra que condicionou milhares de pessoas ao refúgio. Não é muito difícil imaginar que do outro lado do atlântico muitas pessoas tivessem uma péssima impressão dos refugiados que iriam chegar, praticamente descalços e sem grandes perspetivas de vida. Claro que nem todos os povos que emigraram para os EUA foram tão bem sucedidos como alguns europeus. Com a emigração forçada também chegaram a máfia italiana, judeus radicais, etc…  O que concluir daqui? Provavelmente que é certa a ideia que muitos refugiados nos vão trazer problemas. Como é certa a ideia que muitos refugiados nos vão trazer coisas boas. Mas o que parece manifestamente improvável é que todos os refugiados nos tragam coisas boas como todos os refugiados nos tragam coisas más. Mas daqui também poderíamos ser levados a outra conclusão curiosa: o acolhimento de refugiados, como acabamos de ver, tem consequências más, mas também tem consequências boas. O mesmo então seria de esperar do não acolhimento. Em ambos os casos, coisas boas e coisas más. O que não parece aceitável na discussão é qualquer uma das posições mais radicais: que só há boas consequências ou que só há más consequências. Para referir uma má consequência: vamos supor que não aceitamos refugiados. Passados 10 anos somos invadidos pelos chineses e a maioria da nossa população terá de fugir para salvar a vida para países como Egito ou Argélia, que, nessa altura, até eram países seguros e pacíficos. Mas porque não os aceitamos no passado, eles agora não nos aceitam e somos obrigados a uma situação de guerra que não escolhemos.
Ainda um contra argumento ao argumento que defende que também os europeus também se refugiaram nos EUA: é que os refugiados desta vaga não tem o nível de instrução que os europeus tinham. Tem uma escolaridade baixa e por isso não tem educação. Ora, parece que este aspeto depende mais da forma como se faz o acolhimento do que do nível de instrução. Mesmo que seja verdade (o que neste momento não sei dizer) tudo depende de como a integração for feita.
Como referi mais acima, não analisei os outros argumentos da tabela. Não interessa tanto esclarecer os argumentos ou, sequer, marcar uma posição. Neste pequeno e modesto trabalho apenas pretendo contribuir com algumas pistas para a condução de uma discussão aberta, racional e inteligente. Espero ter conseguido.

Algumas regras elementares para melhorar a discussão:

1.      Evitar a ofensa deliberada (já que se pode ofender sem ter a intenção de)
2.      Ter algum cuidado com as fontes citadas. Há fontes para todos os gostos disfarçadas de estudos científicos. A esmagadora maioria dos problemas tratados não são sequer tratados cientificamente e os problemas científicos são problemas e não respostas.
3.      Dar especial relevância às premissas (razões) invocadas e menos às conclusões a que se chega, pois só assim é possível um debate produtivo.
4.      Dar a liberdade às pessoas de defender o que quiserem, mesmo que sejam ideias à primeira vista, completamente tolas
5.      Estabelecer um limite a partir do qual a discussão não é mais viável (em regra proponho que esse limite se situe na ofensa direta e deliberada)
6.      Sobretudo testar as nossas próprias ideias em vez de as querer impor aos outros. Quando defendemos que pensamos criticamente queremos dizer que somos capazes de criticar as nossas próprias ideias.

Dada a polémica que este problema suscita, gostaria de deixar um apelo para sugestões e comentários onde eventualmente a exposição do problema possa falhar, pois certamente contém muitas falhas sobre as quais sou o único responsável.

Notas:

Para este texto a definição que usei de xenofobia é a que aparece no dicionário Priberam e que serve perfeitamente o propósito.
Xenofobia: aversão aos estrangeiros, ao que vem do estrangeiro e ao que é estranho ou menos comum. Xenófobo: que ou quem detesta os estrangeiros ou manifesta xenofobia.
A definição de Thomas Mautner, Dicionário de Filosofia, Ed.70 de racismo também é interessante para o propósito do texto:
1.      Perspetiva baseada na ideia, em inglês por vezes chamada racialism, de que a humanidade está dividida em raças naturalmente distintas que podem ser classificadas em ordens de superioridade, e que atribui a outra raça qualidades inferiores ou perigosas. Esta perspetiva é frequentemente associada à ideia de que nas relações com a outra raça, a inferioridade ou o caráter perigoso desta justificam a suspensão das restrições morais habituais.
2.      A prática de discriminar com base na raça, com desvantagem dos membros da outra raça.
Os racistas consideram frequentemente a outra raça como biológica, intelectual ou moralmente inferior – mas nem sempre. Os sentimentos hostis contra os judeus, os chineses, etc…, surgiram por vezes do medo da sua suposta superioridade racial em determinados aspetos.


*A saída de Einstein para os EUA não foi inicialmente forçada, mas ameaçada ao próprio que acabou por antecipa-la, sendo mais tarde expulso da academia Alemã. Mesmo assim Einstein pretendia, nos EUA, fundar a Universidade de Jerusalém e usou do seu estatuto para proteger judeus refugiados. Fonte: Johannes Wickert, Albert Einstein, Ed. Sol90, Expresso, 2011 (Prefácio Nuno Crato). 

terça-feira, 24 de março de 2015

O que o dinheiro não pode comprar, Michael Sandel


Acabo de saber que está publicado pela Presença o livro do filósofo político de Harvard, Michael Sandel, O que o dinheiro não pode comprar. Mais uma leitura a seguir com atenção para quem se interessa por estes problemas da filosofia política. Recordo que pela mesma editora temos já publicado o excelente Justiça


Devemos recompensar monetariamente as crianças por lerem livros ou terem boas notas? Deveremos permitir que as empresas paguem para obterem o direito de poluírem a atmosfera? É ético aceitar ser pago para tatuar o nosso corpo com mensagens publicitárias?

Vivemos numa época em que quase tudo pode ser comprado e vendido. Nas últimas décadas, os valores do mercado infiltraram-se em quase todos os aspetos da nossa vida - saúde, educação, justiça, governo e até família -, e deixámos de ter uma economia de mercado para passarmos a ter uma sociedade de mercado. Mas que preço pagamos por vivermos numa sociedade em que tudo está à venda? 

Em O Que o Dinheiro Não Pode Comprar, o autor procura lançar o debate, de forma a repensar o papel e o alcance dos mercados nas nossas práticas sociais, nas relações humanas e na vida quotidiana. E, acima de tudo, Michael J.Sandel procura responder à questão fundamental: como podemos proteger aquilo que é verdadeiramente importante?

domingo, 11 de janeiro de 2015

A liberdade de expressão para praticar na sala de aula

Pensando ainda nos recentes acontecimentos em Paris e sobre o jornal satírico Charlie Hebdo, levanta-se novamente o problema de saber quais os critérios que possam definir universalmente os limites da liberdade de expressão. No manual Como Pensar Tudo Isto? (2014, Sebenta) apresentamos um pequeno capítulo com um ensaio de resposta de Stuart Mill a este problema fundamental das sociedades e da vida dos seres humanos. Fica a sugestão de exploração com os alunos em sala de aula.

Como leitura sugere-se também este ensaio de Pedro Madeira.



segunda-feira, 21 de abril de 2014

LOne Survivor e Michael Sandel


Lone Survivor é um filme de 2013 sobre um episódio verídico vivido por soldados americanos no Afeganistão. Um pequeno grupo de soldados comandados por Marcus Luttrell é incubido de atacar uma tribo de soldados da Al-Qaeda, de forma a neutralizar as suas ações terroristas. Para tal refugiam-se nas montanhas. Enquanto preparam a sua missão deparam-se com um pequeno grupo de pastores acompanhados das cabras. Surge um dilema aos soldados. Por um lado não deviam matá-los pois eles não fazem parte da missão. Por outro não os matar e soltá-los pode implicar que vão alertar o grupo de terroristas da sua presença e nesse caso todo o grupo de soldados serão mortos, bem como não será neutralizado a célula terrorista. A decisão cabe a Marcus Luttrell, chefe da missão.
Este dilema, sobre o qual foi realizado o filme, aparece também no livro de Michael Sandel, Justiça, fazemos o que devemos?, Ed Presença, 2011, um dos livros mais acessíveis e apetecíveis sobre filosofia política que pode ser lido em língua portuguesa, mesmo sem dominar qualquer conteúdo de filosofia política.

O filme é um filme de guerra e algo pesado para pessoas mais sensíveis.  




Filosofia Política

Um excelente vídeo para as aulas de filosofia política que, tal como referido nas aulas, deve ser visto e estudado. Devem ativar as legendas na barra do vídeo.



domingo, 23 de março de 2014

Justifica-se a Desobediência Civil?

Este é o quadro síntese das últimas aulas


Problemas de Filosofia Moral (que já estudamos)
Problemas da Filosofia Política: (que vamos estudar)
Problemas da Filosofia do Direito (que estamos a estudar)
- Que quer dizer juízos morais?
- Como é possível saber o que é certo e errado?
- Quando, se é que alguma vez, é certo matar uma pessoa? (respostas de Mill e Kant)
- O que é o Estado?
- Os governos têm o direito de exigir obediência?
- O que é a justiça?
- O que é uma lei?
- Quando devemos obedecer à lei?
- Quando é que o castigo é moralmente justificável?



No que diz respeito ao problema da articulação entre ética, direito e política, optamos por formular o problema de tentar saber se a desobediência civil se justifica, pressupondo que existem leis injustas.
Para acompanhar bem o problema nada melhor que ler o texto que pode ser visto integralmente aqui (Trad. Alvaro Nunes): CLICAR
Deixo no entanto uma parte do texto aqui no blog:


Objecção: Não se justifica a desobediência civil em democracia. As leis injustas feitas por um poder legislativo democrático podem ser mudadas por um poder legislativo democrático.
Resposta: Thoreau, que praticou a desobediência civil numa democracia, defendeu que às vezes a constituição é o problema e não a solução. Defendeu também que nasceu para viver e não para fazer lobby; os canais legais podem levar demasiado tempo. O seu individualismo deu-lhe outra resposta: especialmente numa democracia, os indivíduos são soberanos e o governo detém o poder apenas por delegação dos indivíduos livres. Por isso, qualquer indivíduo pode decidir pôr-se fora do domínio da lei. Martin Luther King, Jr., que também praticou a desobediência civil numa democracia, pede-nos que olhemos mais de perto para os canais legais de mudança. Se em teoria estão abertos mas na prática estão fechados ou injustamente bloqueados, então o sistema não é democrático de forma a tornar a desobediência civil desnecessária. Outros activistas chamaram a atenção para o seguinte: se a revisão judicial é uma das características da democracia americana que supostamente torna a desobediência civil desnecessária, então ironicamente ela subverte este objectivo, porque para poder levar um decreto injusto a tribunal de modo a que este seja examinado, é frequente o queixoso ter de ser preso por violá-lo. Finalmente, os princípios de Nuremberga exigem que se desobedeça às leis nacionais ou às ordens que violem a lei internacional, um dever supremo mesmo (talvez especialmente) numa democracia.
Objecção: Mesmo que a desobediência civil às vezes se justifique numa democracia, os activistas devem primeiro esgotar os canais legais de mudança e optar pela desobediência civil apenas em último recurso.
Resposta: Os canais legais não podem ser «esgotados». Os activistas podem sempre escrever outra carta para sua delegação do congresso ou para os jornais; podem sempre esperar por outra eleição e votar de forma diferente. Mas, proclamou King, uma justiça que é adiada é uma justiça negada. King defendeu que, a partir de um certo ponto, a paciência na luta contra uma injustiça perpetua a injustiça e que este ponto fora há muito superado na luta de 340 anos contra a segregação na América. Na tradição que justifica a desobediência civil apelando a uma lei superior, as subtilezas legais contam relativamente pouco. Se a superioridade de Deus sobre César justifica a desobediência a uma lei injusta, então essa mesma superioridade permite que a desobediência ocorra mais cedo do que seria possível. Nesta tradição, A. J. Muste defendeu que usar canais legais para combater leis injustas é participar numa máquina diabólica e dissimular a dissidência sob a capa da conformidade; isto, por seu lado, corrompe o activista e desencoraja os outros levando-os a subestimar o número dos seus congéneres.
Objecção: O contrato com os outros membros da sociedade obriga-nos a obedecer à lei. Ao vivermos no estado e ao gozarmos dos seus benefícios aprovámos tacitamente as suas leis.
Resposta: Obviamente, esta objecção pode ser evitada por quem quer que recuse a teoria do contracto social. Mas, surpreendentemente, muitos activistas da desobediência aceitam esta teoria, sendo assim obrigados a responder a esta objecção. Sócrates faz esta objecção a Críton, que o instiga a desobedecer à lei fugindo da prisão antes de ser executado. Thoreau e Gandhi respondem ambos (como parte de respostas maiores e mais complexas) que aqueles que se opõem intensamente às injustiças cometidas pelo Estado podem, e devem, renunciar aos benefícios que recebem do Estado vivendo uma vida de simplicidade e pobreza voluntárias; esta forma de sacrifício é usada para anular o consentimento tácito em obedecer à lei. Outra resposta de Thoreau é que consentir em juntar-se a uma sociedade e obedecer às suas leis deve ser sempre um acto explícito e nunca tácito. Mas até para Locke, cuja teoria do contrato social introduz o termo «consentimento tácito», se o Estado quebra a sua parte do contrato, a teoria permite a desobediência e mesmo a revolução. Uma resposta da tradição da lei natural, usada por King, é que uma lei injusta não é sequer uma lei, mas uma perversão da lei (S. Agostinho, S. Tomás de Aquino). Por conseguinte, consentir em obedecer às leis não se estende às leis injustas. Uma resposta dada por muitos negros, mulheres e americanos nativos é que o dever de obedecer é uma questão de grau; se não são membros de pleno direito da sociedade americana, então não estão completamente submetidos às suas leis.
Objecção: O que aconteceria se toda a gente praticasse a desobediência civil? A desobediência civil não passa o teste da universalizabilidade de Kant. A maior parte dos críticos prefere expressar esta objecção como um argumento do declive ardiloso. A objecção tem assim uma versão descritiva e uma versão normativa. Na versão descritiva prediz-se que o exemplo dos que praticam a desobediência civil irá ser imitado, aumentando a ilegalidade e a tendência para a anarquia. Na versão normativa faz-se notar que, se a desobediência se justificada para um grupo cujas crenças morais condenam a lei, então justifica-se para qualquer grupo em situação semelhante, o que constitui uma receita para a anarquia.
Peter Suber 

terça-feira, 14 de maio de 2013

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Será que Rawls é um utilitarista?


Quando leccionei John Rawls, no final da exposição da sua teoria levantei o seguinte problema aos alunos: será que Rawls pode ser um utilitarista? A discussão foi na maioria dos casos bastante animada, mas se fosse contabilizar os resultados, a maioria dos alunos responderam que sim, que John Rawls ao pretender a igualdade de oportunidades (um dos princípios da Justiça) é utilitarista já que pretende a maior bem estar para a maioria das pessoas. Quando vi estes resultados coloquei o seguinte problema:

Vamos supor uma sociedade e duas possibilidades. O grau de bem estar nesta sociedade mede-se de 0 a 10, sendo que 0 é o pior bem estar e 10 o máximo bem estar. Esta sociedade é composta por 5 indivíduos.

Assim:
Sociedade A: 8, 8, 7, 0, 1
Sociedade B: 3, 3, 3, 3, 3

Se contabilizarmos o resultado total de bem estar a sociedade A tem 24, ao passo que a Sociedade B tem 15.

Perguntei então aos alunos qual a sociedade onde existe maior bem estar, ao que todos responderam que é a sociedade A. Mas perguntei de seguida qual seria a sociedade que Rawls defenderia como a mais justa, ao que todos responderam que seria a B.

Com este exemplo os alunos compreenderam uma questão importante: que Rawls não é utilitarista, já que um utilitarista defenderia a sociedade A uma vez que é aquela onde existe a maximização do bem estar (até para um maior número de pessoas), mas, ao mesmo tempo, é a menos igualitária e onde existe uma mais desequilibrada distribuição do bem estar.

Antes tinha feito um outro pequeno exercício. Pedi aos alunos que imaginassem a sua turma como sendo uma sociedade. Na possibilidade A, apenas 2 alunos alcançariam o resultado de 18 em 20 valores e todos os outros teriam notas negativas. Na sociedade B todos teriam uma nota de 10. Em qual preferiam viver? Muitos alunos responderam que preferiam viver na sociedade B. De seguida perguntei: vamos imaginar que o aluno a quem questiono é o que tem 18 na sociedade A. E foi engraçado ter percebido que a maioria escolheria a sociedade A.

Ou seja, os alunos escolheriam a sociedade B se não soubessem à partida que lugar ocupariam na sociedade (que nota teriam, neste exemplo), mas se soubessem que seriam o aluno de 18 já recusariam o sociedade B.

Conclusão: na posição original jogamos pelo seguro.

Que objecções se podem levantar neste exercício?

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Para estudar John Rawls

Para estudar John Rawls recomenda-se vivamente este texto (clicar AQUI). Deixo, no entanto, a primeira parte do texto que lança as bases do problema.

Há crianças vendidas por pais extremamente pobres a quem tem dinheiro e falta de escrúpulos para as comprar; pessoas cujo rendimento não permite fazer mais do que uma refeição por dia; jovens que não têm a menor possibilidade de adquirir pelo menos a escolaridade básica; cidadãos que estão presos por terem defendido as suas ideias. Perante casos destes sentimos que as nossas intuições morais de justiça e igualdade não são respeitadas. Surge assim a pergunta: Como é possível uma sociedade justa? Este problema pode ter formulações mais precisas. Uma delas é a seguinte: Como deve uma sociedade distribuir os seus bens? Qual é a maneira eticamente correcta de o fazer? Trata-se do problema da justiça distributiva. A pergunta que o formula é a seguinte: Quais são os princípios mais gerais que regulam a justiça distributiva? A teoria da justiça de John Rawls é a resposta mais influente a este problema. Esta lição irá sujeitar à tua avaliação crítica os argumentos em que se apoia e algumas objecções que enfrenta.

Faustino Vaz 

domingo, 21 de abril de 2013

John Rawls e a justiça distributiva

Há poucas aulas andamos a discutir qual a melhor forma de distribuir a riqueza, um problema discutido pelo filósofo americano John Rawls. Michael Sandel expõe com exemplos o problema neste vídeo que é uma boa ferramenta de estudo para este problema.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Filosofia Política para principiantes


Para os meus alunos reproduzo aqui uma muito breve exposição dos problemas de filosofia política que estudamos nas aulas, um texto assinado pelo meu amigo Domingos Faria que trabalha comigo no manual on-line da Sebenta Editora. O texto está alojado AQUI.


(I)
Os dois principais problemas de filosofia política estudados no ensino secundário são os seguintes:
Problema da justificação do Estado

Será que a autoridade do Estado é legítima? Ou seja, num Estado os cidadão são obrigados a obedecer às leis, às sentenças dos juízes, às ordens da polícia, etc. Caso desrespeitem isso, são forçados a pagar coimas ou a ir para a prisão. Mas por que razão cidadãos autónomos devem ser tratados desta forma?

A este problema os anarquistas respondem negativamente: a autoridade do Estado é uma mera violação ilegítima da liberdade das pessoas.
                                                                                         
Porém, existem respostas positivas ao problema de dois tipos:

Por um lado, naturalistas, como Aristóteles, defendem que o ser humano não se desenvolve isoladamente, mas em comunidade; sobretudo na comunidade mais completa e perfeita que é a “polis” (cidade-estado), a qual visa assegurar a vida boa. Assim, a vida na “polis” corresponde a uma necessidade natural dos seres humanos, pelo que o Estado tem uma justificação natural.

Por outro lado, contratualistas, como Locke, defendem que o Estado tem origem num contrato celebrado entre pessoas livres de forma a proteger as suas vidas e propriedades. A ideia é que no estado de natureza (numa situação sem Estado politicamente organizado) existem problemas, como a questão da administração da justiça. Para que a propriedade não fique ameaçada, as pessoas celebram tacitamente um contrato social e aceitam livremente a origem do governo.
Problema da justiça social

Será justa uma sociedade na qual a distribuição de rendimentos e riqueza é desigual? Ou apenas será justa se tal distribuição for igual? Imaginemos uma sociedade em que grande parte das pessoas vive em grande pobreza, apesar de existir uma pequena elite de pessoas multimilionária. Será esta sociedade justa? Imaginemos outra sociedade em que as pessoas têm exatamente a mesma riqueza e em que tudo é distribuído igualitariamente. Será justa uma tal sociedade onde todos têm o mesmo, independentemente do que trabalhem, do que se esforcem ou dos dons que tenham? Afinal, o que é efetivamente uma sociedade justa?

A este problema Rawls responde, numa perspetiva tendencialmente mais igualitarista, que numa sociedade justa deve-se assegurar iguais liberdades e oportunidades para todos e que a redistribuição do rendimento e da riqueza deve ser feito à luz deste objetivo. Por isso, não aceita distribuições muito desiguais, uma vez que limitam consideravelmente as liberdades e as oportunidades dos mais pobres. Aliás, as desigualdades na distribuição só são aceitáveis se trouxerem benefícios para todos, de modo especial para os mais desfavorecidos. Se não for esse o caso, então o Estado deve intervir, por exemplo, com impostos e outras tributações, de modo a manter este padrão de justiça que assegure iguais oportunidades e liberdades para todos.

Já Nozick considera que esta interferência do Estado é eticamente inaceitável, pois viola direitos de propriedade e desrespeita a liberdade individual de cada um gerir o seu rendimento e riqueza como bem entender. Por isso, Nozick avança com uma conceção alternativa de justiça que é libertista.

(II)
Além destes problemas, existem outros interessantes que se podem tratar com os alunos, como é o caso do “problema da desobediência civil” (existirão casos em que violar a lei é moralmente aceitável?) ou do “problema da descriminação positiva” (serão justas as leis que favorecem umas pessoas em relação a outras, como o caso da lei da paridade?).

Perante estes problemas e teorias os professores devem estimular o pensamento crítico dos alunos de modo a que eles assumam uma decisão e posição fundamentada. Em relação a muitos problemas filosóficos, não decidir pode ser uma posição respeitável. Porém, em política, a indiferença é uma posição autorrefutante, pois não decidir ou não ter posição é deixar que outros decidam por nós (seja o que for que decidam). Como alerta o filósofo Jonathan Wolff, na introdução do livro An Introduction to Political Philosophy (tradução portuguesa na Gradiva),
(…) pode não interessar se uma sociedade não tem uma política oficial sobre a solução para o problema do livre-arbítrio, mas em todas as sociedades há alguém que detém o poder político e a riqueza encontra-se distribuída de uma forma ou de outra. (…) Aqueles que preferem não participar verão as decisões políticas serem tomadas por si, quer gostem delas quer não. Nada dizer ou fazer é, na prática, dar aval à situação atual, por insatisfatória que seja.

Domingos Faria