Nem só de livros vive a filosofia. Vive, e muito, de artigos,
teses académicas, palestras, conferências, vídeo aulas, etc. Mas o formato
livro dá conta também do interesse comercial de um determinado saber. Diria que
o interesse português pela filosofia é bastante modesto. E desconfio que é
assim quanto ao interesse geral pelo conhecimento. Mas também já foi pior. E também
não sei dizer que benefício haveria em ter publicações em grande númerotodos os meses. Seja como for quando quero
fazer a lista dos melhores livros de filosofia publicados em Portugal ao longo
de 1 ano apenas, raramente consigo chegar aos 10 livros. Claro que foram
publicados mais. Simplesmente aqui o critério da lista é também muito apertado.
Eu, como leitor, sou o critério (risos). Assim, de seguida, apresento aqueles
que foram para mim as edições mais interessantes no campo da filosofia
publicada em Portugal. Pelo meio escolho sempre um ou outro título não
diretamente ligado à filosofia, mas pelo menos com algumas conexões indiretas. Finalmente,
a filosofia não se lê por anos. Isto significa que um leitor de filosofia não
lê um livro em função do ano de publicação, mas do interesse para a discussão
de um determinado problema. De salientar que os maiores grupos editoriais
portugueses praticamente não publicam filosofia.
1.Jason
Brennan, Contra a Democracia, Gradiva, Trad. Elisabete Lucas
2.Yuval
Noah Harari, Homo Deus, Elsinore, Trad. Bruno Amaral
3.Peter
Singer, Ética no mundo real, Ed. 70, Trad. Desidério Murcho
4.John
E. Roemer, Um futuro para o socialismo marxista, Gradiva, Trad. José S. Pereira
5.Harry
Frankfurt, Sobre a verdade, Gradiva, Trad. Mª Fátima Carmo
6.Roger
Scruton, A natureza Humana, Gradiva, Trad. Mª Fátima Carmo
7.Bernard
Williams, A ética e os limites da filosofia, Documenta, Trad. A. Morão e D.
Santos
8.António
Damásio, A estranha ordem das coisas, Temas & Debates, Trad. Luís Oliveira
e João Quina
Para 2018 gostaria de ver traduzidos muitos livros. Mas para
já ficaria contente com a publicação entre nós de alguns dos livros de Julian
Baggini, para mim, provavelmente o melhor escritor de filosofia popular mais
estimulante do momento e do qual ainda não temos um único livro traduzido. Gostaria
também de ver traduzida a breve introdução à filosofia política muito bem
escrita por David Miller. E também agraciava a tradução do livro sobre o
problema do livre arbítrio de Ted Honderich, How free are you? The determinismo
problema. Apesar de já ter uns anos é um excelente livro. Mas não ficaria
triste de ver mais livros de autores como Thomas Nagel, Jason Brennan, Jeff
Macmahan ou David Benatar, todos eles autores com livros muito apetitosos.
Esperemos que tal aconteça.
Quem leciona filosofia certamente já foi confrontado com
observações contraditórias por parte dos seus alunos. De uma mesma aula, alguns
alunos dizem que “a filosofia entende-se
bem”, “o professor é muito claro nas
explicações das teorias” ou, ao invés, “esta
aula é uma confusão”, “o professor é
um confuso”. Do ponto de vista de quem ensina o caminho fácil é considerar
os alunos que fazem o primeiro tipo de afirmações uns amores e os que fazem o
segundo tipo, uns estupores. Mas ensina-nos a vida que o caminho mais fácil
nunca é o melhor e talvez estas afirmações dos alunos mereçam alguma
consideração com detalhe. Ao mesmo tempo sabemos que a referência generalizada
nas dificuldades quanto às aprendizagens na matemática é a conhecida “falta de bases”. Pois, o que me parece
acontecer na filosofia é exatamente o mesmo, falta de bases. Não é por acaso que a filosofia ocorre nos
currículos somente no ensino secundário, ou pelo menos com especial incidência
na adolescência (pese embora experiências paralelas meritórias na filosofia
para crianças). E ocorre nesta etapa da vida dos estudantes precisamente porque
se considera que neste nível o estudante é capaz de abstração. Para compreender
o problema do livre arbítrio, a causalidade não é coisa que se veja com
os olhos. Quando um aluno vê o professor empurrar uma garrafa de água é somente
isso mesmo que vê, muitas das vezes sem compreender que existe ali um fenómeno
físico e material de causalidade. A causalidade
é uma medida que se capta com a mente e não com os olhos. Se este terreno de
base não está preparado, será, assim, muito difícil ao aluno compreender a
relação estabelecida entre causalidade
natural e livre arbítrio e, daí,
captar a essência do problema.
Existe uma tendência para estes alunos com dificuldade de
apreensão abstrata em considerar que as aulas devem ser um despejar de
definições que se decora acriticamente. Claro está que perante alunos com estas
características a filosofia pode ser uma grande desvantagem. E para o professor
sobra trabalho suplementar já que tem de trabalhar em função desta incapacidade,
ou melhor, desta capacidade ainda não treinada. Além de ter de saber resistir
aos comentários dos alunos em relação às matérias que tem para com eles
trabalhar.
Há formas muito simples de compreender se esta base da
abstração está ou não trabalhada. Por exemplo, com a exibição de uma reprodução
da Guernica, uns alunos vão observar
que estão a ver um boi, uma lâmpada, um homem aos berros, quando outros, perante
o mesmo desafio, já observam que estão a ver sofrimento, confusão, caos e
miséria. Roubando um pouco à teoria de Piaget, diria que os primeiros ainda
militam na fase das operações intelectuais concretas, quando os segundos já
estão na fase das operações abstratas.
Os testes diagnóstico podem dar uma primeira imagem ao
professor do estado dos alunos e o que pode esperar das suas aprendizagens. No caso
dos alunos com esta capacidade ainda não trabalhada, o melhor mesmo é avançar
com a leitura de pequenos textos com algum grau de abstração (como qualquer bom
texto de filosofia) e pedir comentário quase linha a linha. Mas no nosso
sistema formal de ensino, não há tempo a perder, pelo que há que procurar o equilíbrio
entre este trabalho e o avanço dos conteúdos. Mas parece claro que os alunos
avançam a ritmos muito diferenciados em virtude da sua capacidade de
compreender o mundo abstratamente. E qualquer professor do secundário está
consciente das dificuldades encontradas nos alunos sem esta base: preguiça,
reacionarismo em relação à disciplina e ao professor, etc. É uma luta dura.
Um trabalho interessante é ter algumas ideias minimamente
sólidas das razões por que estas bases não são consolidadas. E existe muita
literatura interessante sobre o assunto, desde a sociologia até à psicologia e
as neurociências. Mas é difícil atirar com certezas perante esta dificuldade.
Entre as razões mais imediatamente compreensíveis estão as
sociais e familiares. Um aluno médio de 15 anos pode saber perfeitamente o nome
dos defesas centrais do atual plantel do Benfica (e não há mal algum nisso),
mas dificilmente ouviu falar de Picasso. E que razão me leva a pensar que há aqui
um qualquer hiato entre aquilo que a realidade é e aquilo que ela deveria ser?
Porque o futebol, pese embora possa ser abstratamente analisado, lida diretamente
com as emoções e é essa a relação mais comum que a esmagadora maioria dos
adeptos de futebol têm com a modalidade. Mas olhar uma obra de Picasso exige
alguma abstração, pelo que o exercício implica algum trabalho intelectual. E é
exatamente este o trabalho que muitas das vezes as famílias, meios de
comunicação e sociedade em geral poderiam fazer de modo mais consistente e que,
na minha opinião, não fazem.
Este trabalho é comunitário no sentido em que não cabe
exclusivamente aos professores, mas a todos. Quando confiamos apenas nos
professores para realizar este trabalho não deveria pelo menos ser estranho que
os alunos muitas das vezes considerem a filosofia confusa quando com ela se
confrontam pela primeira vez.
Link da imagem: (https://gartic.com.br/luchfe/desenho-jogo/confuso)
Voltar a estudar após uma certa idade é uma pratica ainda
muito tímida em Portugal. Mas devia acontecer com maior frequência. Estudar é
das atividades humanas mais motivadoras. A repetição profissional ao cabo de
alguns anos implica desgaste e falta de motivação. Imediatamente pensamos em
mais dinheiro como principal foco motivacional. Mas após asseguradas as
necessidades básicas não é com mais dinheiro que vamos criar mais motivação. A experiência
com a Universidade Senior é uma excelente ideia. Mas o que aqui refiro
destina-se mais a pessoas inseridas no mundo profissional e não a reformados. Estudar
filosofia aparece aqui com um destaque interessante, senão vejamos rapidamente
algumas das principais vantagens de estudar filosofia no mundo de hoje:
Argumentação – é o nervo central da filosofia. Estudar
filosofia é entrar no gigantesco diálogo sobre questões básicas. Não são
básicas no sentido de serem as mais simples, mas as questões mais essenciais de
compreensão da vida humana e do mundo.
Ceticismo – uma boa dose de ceticismo é a base
para a análise crítica de problemas e de tentativa de solucioná-los. Sem essa
dose certa de ceticismo não se exerce a capacidade crítica e sem ela não se
apresenta qualquer tipo de evolução seja em que área for da vida humana.
Abstração – uma capacidade que também se exerce
com a arte, matemática, etc. A abstração é uma maneira de compreensão do mundo
e dos outros, sem a qual, essa compreensão seria muito mais sujeita a impasses
e erros de interpretação. A abstração é o primeiro passo para o rigor.
Comunicação – comunicar é expressar pensamentos
e a maneira como estamos a interpretar o mundo. O estudo da filosofia desenvolve
bem esta capacidade, já que quem estuda filosofia lida o tempo todo com a
necessidade de expressar com clareza o que está a pensar. Esse esforço pode
resultar muitas vezes em confusão. Mas quando bem conduzido resulta quase
sempre em clareza.
Compreender a ciência – pode-se ser cientista ou fazer
ciência sem compreender muito bem o que é a ciência e como se desenvolve ou
progride a ciência. Estudar filosofia e principalmente filosofia da ciência é a
porta aberta para a compreensão de como e para quê se faz ciência.
Informação – um dos perigos a que mais estamos
sujeitos no mundo da informação é o da manipulação. Estudar filosofia dota-nos
de capacidade crítica para avaliar e analisar fontes, critérios, etc. É também
uma maneira de prevenir contra a má ou enviesada informação.
Política – um sistema mais perfeito é um
sistema em constante aperfeiçoamento. Pensar que vivemos no melhor dos mundos
possíveis é ao mesmo tempo aceitar que não existe melhor do que o que já temos.
Ora esta não é a postura adquirida por quem quer que estude filosofia. Repensar
sistemas políticos, compreender porque podem não funcionar, etc é uma das
capacidades desenvolvidas pelo estudo da filosofia.
Liberdade – Ousa saber! Os filósofos não tem
praticamente limites na abstração. Ou antes diria que os limites são critérios
como a clareza. Mas a liberdade crítica é uma prática entre filósofos. E uma
prática adquirida por quem estuda filosofia, uma capacidade de não impor
nenhuma verdade como incontroversa.
Quando, o ano passado por altura
do natal estive em Londres, este livro do historiador israelita Yuval Noah Harari
fazia montra nas principais livrarias. Isso não atesta por si da qualidade do
livro. Mas é prova da ampla curiosidade que o livro desperta. E ainda bem, pois
é um livro muito bem escrito e extraordinariamente estimulante. Pese embora o
pendor especulativo não é, no entanto, um livro de filosofia. Antes pelo
contrário, a preocupação não é defender ou refutar argumentos, mas perspetivar
um futuro não muito longínquo. Se em Homo Sapiens a história era contada até ao
presente, em Homo Deus, a história conta-se a partir do momento presente. Lúcido
e de fácil leitura é, como me dizia um amigo, um livro que qualquer pessoa
culta hoje em dia deve ler.
sábado, 11 de novembro de 2017
Há uma nova secção no blogue, a Biblioteca do Educador. Mais uma vez os livros nela referenciados são o reflexo do meu itinerário bibliográfico pessoal. Para já apenas refiro as capas dos livros. Mais tarde consoante a vontade e o tempo disponível, incluirei um breve comentário de cada um deles. Como será de notar, os livros não seguem uma "escola" da educação. Mas quase todos são sugestivos para a discussão do que deve ser a escola e a profissão de professor assim como o lugar dos alunos e das suas aprendizagens. A secção pode ser apreciada Aqui, ou na aba acima na barra de abas.
Em Portugal Setembro é o mês do regresso às aulas. Nos
últimos anos tem sido marcado negativamente em várias frentes: os pais e o
custo financeiro com os manuais e material escolar, os professores com a enorme
instabilidade profissional, a rede escolar com problemas de equilíbrio, etc… de
uma forma resumida o que mais marca o início de cada ano letivo são as
alterações das “regras do jogo”. Mas ao mesmo tempo que alguns aspetos no
ensino mudam de ano para ano (por vezes menos), outros há que não mudam há mais
de uma década. O programa de filosofia vigente data de 2001 (ver
aqui). Muitas mudanças no ensino acontecem porque cada ministro que sucede
o anterior, assim como as novas equipas, têm ideias diferentes e querem assim
imprimir a sua marca, não se dando conta que desse modo estão a estragar mais
do que o que arranjam. Neste sentido, ainda bem que o programa de filosofia não
tem sofrido alterações. Alterar apenas porque sim, não me parece uma boa ideia.
E alterar apenas porque se discorda totalmente também não me parece razoável.
Há um trabalho de base meritório que vale a pena retocar. Afinal de contas,
nós, professores, andamos há tantos anos nisto, a trabalhar um programa que
parece insensato querer alterar tudo de uma só vez. Felizmente as propostas que
entretanto se vão falando não seguem esse sentido, o de tudo alterar. A proposta,
oficial de revisão curricular para a disciplina no 10º ano já circula
livremente (ver
aqui). E ela inclui alguns aspetos muito interessantes, embora, claro,
discutíveis. A inclusão da lógica elementar logo a abrir o 10º ano parece-me
uma opção correta como método de trabalho. Mas é igualmente importante que os
tempos letivos para cada unidade sejam pensados não de modo a explorar os
conteúdos teóricos sem considerar o trabalho e tempo necessário em sala de aula
para trabalhar textos, interpretação aplicando os métodos aprendidos, gerir
comportamento adequado ao trabalho, etc. Claro que começar a disciplina pela
apresentação do método não é, em muitos sentidos, uma opção feliz. Se o que
anima a disciplina, por que não começar logo por debater os problemas? Haveria
algum prejuízo em começar a ensinar astronomia olhando para as estrelas?
É sobretudo importante que as mudanças não impliquem
transformações de fundo constantes, muitas vezes quase ao sabor do vento
ideológico ou de preferências grupais sem atender os muitos e diversos
contextos em que a disciplina se ensina. As mudanças permanentes atrapalham o
trabalho nas escolas e em regra acabam sempre por desmotivar.
Por fim, uma palavra aos professores de filosofia. Segundo percebo
são muitos os professores de filosofia que não ensinam filosofia. Isto acontece
porque os horários têm vindo a diminuir e, entretanto, os disponíveis acabam
todos ocupados por professores de quadro de escola e com mais tempo de serviço.
Por isso mesmo em muitas escolas os professores de filosofia estão a ensinar
disciplinas que não a filosofia. Não considero a filosofia mais essencial que
muitas outras disciplinas que podem ser ensinadas. Afinal, poderíamos ter um
currículo diferente e até melhor com ou sem a filosofia. O ponto aqui é outro. Os
professores de filosofia estudaram filosofia e prepararam-se durante alguns
anos para o domínio científico da filosofia. Por isso mesmo e enquanto cá
andamos e é tempo, esta parece ser uma boa razão para assegurar a disciplina no
ensino geral e obrigatório. Como disse, um bom sistema de ensino pode dispensar
uma outra disciplina ou substituindo-a por outra igualmente importante. Daí não
se segue que a disciplina de filosofia seja dispensável. Acontece que, uma vez
existindo, isso é por si mesmo uma boa oportunidade para fazer um bom trabalho
na sua apresentação.
E ainda antes de terminar. Costumo usar uma hipótese quando
pessoas não ligadas ao ensino criticam de forma geral o trabalho dos
professores: “- Vamos imaginar que é verdade que os professores são todos mesmo
maus. Sendo isso verdade e sabendo disso mesmo, o que é que devemos fazer,
substituir todos os professores por carpinteiros nas escolas?” Invariavelmente
a resposta é não. Isto é, temos de trabalhar com o que somos e temos, saber contar
apenas com o nosso trabalho. Tudo o que vier a mais de positivo será bom. Mas não
podemos esperar que sejam os de fora, mesmo os das universidades, a fazer o
nosso trabalho. Não podemos nem devemos esperar que nos preparem os programas,
as aulas, os materiais que usamos. Dependemos apenas de nós mesmos.
Um dos filósofos mais populares e, talvez por isso, mais incómodos
da atualidade para os mais conservadores, numa entrevista à revista semanal
Sábado, nº 686, de 21 a 28 de Junho de 2017. Por Vanda Marques. Nesta pequena
entrevista, Singer aborda alguns dos problemas reunidos no livro Ética no Mundo Real - 82
breves ensaios sobre coisas realmente importantes , publicado entre
nós pelas Ed. 70 e traduzido por Desidério Murcho. Um facto curioso que vale a pena mencionar: Peter Singer é atualmente o filósofo que mais ódios suscita. Quando refiro "ódio" é em sentido literal. Claro que no mundo da filosofia existem filósofos que procuram objetar as posições de Singer, como o seu conterrâneo David Oderberg. Numa versão menos racional, abundam as tiradas anti Peter Singer. Curioso é que as posições de Singer nem sequer são as mais radicais em relação a alguns dos problemas éticos que aborda. E mais curioso ainda é que muitos filósofos do passado, hoje unanimemente idolatrados, foram mais radicais que Singer. Neste como muitos outros casos, Singer paga o preço da fama.
Em Novembro de
2016 promovi, com o Sindicato de Professores da Madeira, uma ação de formação
sobre pensamento crítico e como o usar na sala de aula. Sugeri que parte de
trabalhos de formandos fossem publicados. E aqui está o resultado na edição
xxxviii i nº100 do jornal
Prof, do SPM, Diretor Francisco Silva.
Esta ação irá
repetir-se no Porto Santo nos próximos dias 10 e 11 de Julho. Uma segunda parte
desta ação está a ser preparada.
Nenhum modelo político deve ser sacralizado, por nenhum ser perfeito e não
serem imutáveis as circunstâncias em que algum deles se tenha revelado como o
menos mau.
A edição deste livro é um contributo para as pessoas livres, que o queiram
continuar a ser, debaterem as disfunções crescentes que cada vez mais
visivelmente estão a impedir a democracia de realizar alguns dos seus mais
importantes ideais. É também um desafio para os que visam aperfeiçoar o seu
funcionamento de modo a realizar os seus objectivos essenciais: a liberdade, o
progresso social, a dignidade, o desenvolvimento humano.
A maioria das pessoas acredita que a democracia é a única forma justa de
governo. Crê que todos temos direito a uma quota igual de poder político. E
também que a solução de participação política "um homem um voto" é
boa para nós – dá-nos poder, ajuda-nos a conseguir o que queremos e tende a
tornar-nos mais inteligentes, virtuosos e atentos uns aos outros.
Mas Brennan, considera que estão erradas, argumentando que a democracia
deveria ser julgada pelos seus resultados,apresentando abundantes dados
empíricos de que não são bons o suficiente.
Tal como os acusados têm direito a um julgamento justo, os cidadãos têm
direito a um governo competente. Mas a democracia é com frequência o domínio do
ignorante e do irracional, ficando demasiadas vezes aquém do que se espera.
Além disso, uma enorme diversidade de pesquisa em ciências sociais mostra que a
participação política e a deliberação democrática parecem tender cada vez mais
frequentemente a tornar as pessoas piores – mais irracionais, tendenciosas e
más. Considerando esse quadro sombrio, Brennan argumenta que um diferente
sistema de governo – a epistocracia, ou governo dos sábios – pode ser melhor do
que a democracia, e que é tempo de reflectir seriamente sobre isso.
Longe de se tratar de uma diatribe panfletária, esta é uma relevante obra
de filosofia política em que se discute, de forma intelectualmente honesta,
cada um dos melhores argumentos a favor da democracia. O resultado é uma
crítica séria e uma defesa contemporânea do governo de quem mais sabe, com a
resposta aos problemas práticos que tal solução possa levantar.
Uma leitura essencial não apenas para os estudiosos de filosofia e de
ciência política, mas também para todos os que consideram que a democracia
merece ser discutida, independentemente do que se possa pensar dela, incluindo
os que visam aprofundá-la.»
Jason Brennan é uma maravilha: um filósofo brilhante que estuda
escrupulosamente os factos antes de moralizar. Em Contra a Democracia, o seu
método elegante leva à conclusão inesperada de que a participação democrática
impele os seres humanos a esquecer o senso comum e a decência comum. Votar não
nos enobrece; testa a virtude dos melhores, e apresenta o pior nos restantes.
Bryan Caplan, autor de The Myth of the Rational Voter
A grande tentação da filosofia política é sacralizar a política, e precisamos
urgentemente de um trabalho que nos ensine a não sucumbir. Neste livro valioso
e revigorante, Jason Brennan desafia devoções confortáveis e desacredita mitos
familiares sobre a vida política em geral e o regime democrático em particular.
Prevejo que a maioria dos leitores encontre muita coisa com que discordar – eu
certamente encontro –, mas também que a maioria considere os argumentos de
Brennan inquietantemente difíceis de resistir com certeza.
Jacob T. Levy, Universidade McGill
Contra a Democracia apresenta um conjunto útil de desafios tanto para a
sabedoria convencional como para as tendências dominantes na filosofia política
e na teoria política, particularmente na teoria democrática. Escrito de forma
cativante, incentiva uma leitura activa e divertida.
Alexander Guerrero, Universidade da
Pensilvânia
Autor(es)
Jason Brennan doutorou-se em filosofia
pela Universidade do Arizona, ensinou na Universidade de Brown e é actualmente
professor associado de Estratégia, Economia, Ética e Políticas Públicas na
Universidade de Georgetown. É autor de Compulsory Voting: For and
Against, com Lisa Hill, Libertarianism: What Everyone Needs to
Know, The Ethics of Voting e A Brief History of Liberty,
com David Schmidtz. A filosofia política e a ética aplicada são as suas duas
principais áreas de investigação.
Qual é o problema em desprezar a
verdade? A verdade é algo assim tão importante
e valioso porquê?
Estas são algumas das perguntas que Frankfurt procura esclarecer e às quais dá
resposta em Sobre a Verdade.
A resposta de Frankfurt, exposta numa linguagem despojada de jargão filosófico
e centrada na noção mais comum de verdade, é que a nossa vida seria impossível
sem ela, tanto na prática como intelectual e psicologicamente. Na prática,
porque a distinção entre verdadeiro e falso é pressuposta nas situações mais
banais da vida mesmo por aqueles que dizem recusá-la. Intelectual e
psicologicamente, por ser necessária para a compreensão de nós mesmos como
indivíduos diferentes dos outros, para a nossa relação com eles, e para a mais
elementar compreensão da realidade, seja ela qual for.
Autor(es)
Harry G. Frankfurt é Professor Emérito
de Filosofia na Princeton University. A sua importante obra filosófica
reparte-se principalmente pelas áreas da filosofia moral, da filosofia da mente
e da filosofia da acção. Os seus contributos para a discussão do problema do
livre-arbítrio fazem dele uma referência nesse domínio. Da sua obra,
destacam-se ainda os sucessos de vendas On Bullshit (Da Treta) e The
Reasons of Love.
Peter Singer é o filósofo da atualidade que suscita maiores
hostilidades em relação às suas ideias, ou pelo menos à caricatura que habitualmente
delas se faz. Isto acontece não pela radicalidade dos seus argumentos (há
filósofos mais radicais, mas que raramente são mencionados nas frentes mais
hostis), mas antes pela sua popularidade. A que se deve a popularidade de
Singer? À forma pouco comum como expõe os argumentos que os torna acessíveis mesmo
aos leitores filosoficamente menos informados. Juntando isso aos temas e
problemas que aborda (moralidade do aborto, eutanásia, etc…) temos os
ingredientes necessários para conservadores hostis destilarem os mais variados
insultos. O irónico é que Singer aceita o aborto ou a eutanásia com muitas
restrições, o que até faz dele, em certo sentido, algo conservador. Mais conservador
talvez é ainda em relação à defesa dos direitos morais dos animais não humanos,
uma das mais radicais teses de Singer. Curiosamente os hostis costumam estar-se
nas tintas para os animais e não pegam neste ponto com Singer. Do meu ponto de
vista a popularidade de Singer passa por uma certa injustiça, provavelmente
própria de toda e qualquer popularidade, a de ser superficial. Por essa razão
os ataques dos hostis são todos sem exceção vagos e absurdos, para além de
revelarem manifesta ignorância em relação aos argumentos do filósofo
australiano, professor nos EUA. A melhor forma de conhecer os ataques a Singer
que estão para além dos insultos gratuitos é conhecer a obra de filósofos como David
S. Oderberg, tendo duas obras publicadas em português. Uma delas, Ética
Aplicada, Uma abordagem não utilitarista (Principia, 2009, Trad. M
José Figueiredo), é um ataque ao utilitarismo de Singer. Espero que esta
nova tradução em português, do qual se apresenta aqui a capa, motive mais a
discussão racional que o orgulho irracional. De resto como se espera de toda a
atividade filosófica. A edição é das Ed.70.
Muitas das afirmações dos filósofos são polémicas. Todas elas
são, por natureza do saber e conhecimento, arriscadas. E por isso, em regra,
pouco consensuais com a nossa visão comum do mundo e das coisas. Mas será que
entre essas citações não haverão outras ainda mais arriscadas, verdadeiramente
polémicas contrariando-se até a si mesmas? É isso que este livro recém-chegado
ao mercado português promete oferecer, uma boa coleção de citações verdadeiramente
polémicas. Do autor Victor Correia, com edição da Verso da Kapa. Mais informações
AQUI.
À venda nas livrarias a partir do dia 13 deste mês.
A percepção é o modo como tomamos consciência dos objectos, em especial daquilo que nos é dado pelos sentidos. A pergunta que muitos filósofos colocam acerca da percepção é a seguinte: será que o facto de percepcionarmos objectos é suficiente para justificar a existência desses objectos fora da nossa consciência? A distinção entre aparência e realidade parece indicar que há diferença entre aquilo que as coisas são e a maneira como tomamos consciência delas, isto é, a maneira como as percepcionamos. O modo como funciona a percepção dá lugar a grandes disputas filosóficas e é um tema central nas discussões acerca da natureza do conhecimento. Há três grandes teorias da percepção, com diferentes implicações em termos epistemológicos: o realismo directo, o realismo representativo e o idealismo. Ver também realismo crítico e realismo ingénuo. (Aires Almeida)" in. DEFnarede
Hilary Putnam deve ser dos filósofos, senão mesmo o filósofo
de expressão em língua inglesa da segunda metade do século xx, mais
amplamente traduzido para português. Possivelmente por ser um caso isolado em
matéria de tradução, e não fazendo escola a tradução de livros dos seus pares,
muitas das vezes os conceitos são mal traduzidos, o que acaba por confundir não
só a compreensão como também o estilo do próprio autor. Seja como for, num país
com uma escala filosófica bastante reduzida (pelo menos antes da internet, já
que uma boa parte destas traduções é anterior ao acesso generalizado á rede e
ao consumo online) é salutar ter acesso na nossa língua a uma variedade
considerável de livros de Putnam. Eles aparecem por via da publicação de diferentes
editoras.
A produção de Putnam foi enormíssima com contributos para
diferentes áreas da filosofia. É difícil delimitar uma área de maior
intervenção, muito embora o maior conjunto dos seus trabalhos sejam nas áreas
da filosofia da mente, ação, epistemologia e metafísica. Sempre foi um filósofo que produziu muito e mudou muitas vezes de argumentos e interesse. Deixo aqui a
referência a algumas das traduções que ainda se encontram à venda nas
livrarias. E com algum esforço ainda se encontram as traduções da D. Quixote, já dos anos 90 do século xx.
Este mês ficou marcado na filosofia com o desaparecimento de
Derek Parfit, o filósofo inglês. No meu tempo de Universidade nunca ouvi falar
em tal nome. Conheci-o muito mais tarde e ainda só o conheço quase por
referências indiretas. A vida de um professor de secundário dificilmente se
compatibiliza com o estudo aturado de um só autor ou problema. Além disso há
poucas traduções de Parfit em português. Assim, só se fica a saber que que se
trata de um influente filósofo, mas sem perceber muito bem por quê. Bem, para o
mero curioso não profissional da filosofia, talvez isso seja suficiente. Eu também
não percebo a relevância de todas as teorias científicas que vou aprendendo,
mas começo por aceitar alguma autoridade dos autores de bons livros de
divulgação. Para colmatar essa lacuna e investir um pouco mais, vou aqui
resumir uma pequena bibliografia para que se compreenda um pouco melhor um
problema do qual Parfit se ocupou e avançou novos argumentos. Estou a falar do
problema da identidade pessoal. Melhor que as minhas palavras é ler alguma
coisa e ficar mais informado. Assim, e do que está disponível em português:
James Rachels, Problemas
da Filosofia, Gradiva, Trad. Pedro Galvão. Todo o capítulo 5 é dedicado ao
problema e segue de perto o seminal Reasons
and persons de Derek Parfit. Melhor e mais clara introdução que esta, em
língua portuguesa, não conheço.
Earl Conee e Theodore Sider, Enigmas da Existência, Uma visita guiada à metafísica, Bizâncio,
Trad. Vítor Guerreiro. O capítulo 1 é uma boa introdução ao problema. A par com
a de James Rachels forma o melhor duo em língua portuguesa para começar a
matutar no problema.
Pedro Galvão fez-nos o favor de traduzir o primeiro artigo
de Parfit sobre o problema da identidade pessoal, que podemos encontrar aqui: TRADUÇÃO
Existe um excerto muito interessante para ler na Crítica
traduzido por Galvão, de Reasons and
Persons, AQUI.
E temos aqui este vídeo que está muito divertido e claro. Basta acionar as legendas. Não são muito boas, mas entende-se mais ou menos sem atropelos:
Se há dado que temos consumado é
a divisão da filosofia a partir dos finais do século xix naquela que ficou
entretanto conhecida por filosofia analítica por oposição à chamada filosofia
continental. Não interessa aqui entrar de novo nesse debate já muito
escrutinado. Se aplicássemos aqui vagamente as ideias de Kuhn relativamente à
história da ciência, diríamos que provavelmente a filosofia atravessa a fase da
“guerra” de paradigmas. Isto vem ao caso porque em regra esta divisão também acaba
por se refletir e muito quando pegamos em livros de caráter mais geral, como
dicionários, histórias da filosofia, etc… arrisco a afirmar que hoje em dia
essas obras quando chegadas da tradição analítica falham menos que as da
tradição continental. Isto é, as da tradição analítica são mais abrangentes. E a
isto não está alheio o sucesso em matéria de investigação, se quisermos, do seu
“paradigma”, para abusar dos termos de Kuhn. Este mote serve para a minha
pequena apresentação deste extenso volume publicado pela Piaget no ano de 2003
e sendo o original em francês do ano anterior. Independentemente do conteúdo
que não me é possível comentar de todo (é uma obra de consulta com mais de 1200
páginas na edição portuguesa), vale a pena apresentar em algumas palavras a sua
organização. Assim, para começar, as
grandes noções mencionadas no título da obra, são as clássicas: consciência,
direito, estado, história, imaginação, tempo, ciência, moral, metafísica, arte,
linguagem, etc.. Cada tema corresponde a um capítulo e cada capítulo está
organizado não só com a habitual exploração do subtema, como com os textos
clássicos comentados. Para quem, como eu, está já acostumado com o modo de
fazer filosofia da tradição analítica, não espere destes textos a clareza de
exploração dos problemas no sistema de: problema,
teorias, argumentos, objeções. Nem espere grandes análises aos problemas
pelo binóculo da lógica. Não se segue daí, com efeito, que os textos fossem
escritos por uma quantidade de discípulos de Nietzsche recorrendo a uma
linguagem demasiado fechada e hermética. Aliás, por sinal, isto também acontece
não raras vezes com filósofos da tradição analítica. Embora seja evidente que
prezam muito mais a clareza da exposição nem todos, ainda assim, o conseguem
fazer devido mais ao estilo da escrita do que à confusão argumentativa.
E a quem interessa este livro?
A todos, menos àqueles cujo contato
com a filosofia passa apenas por uma ou duas pequenas introduções, já que no
mercado português existe essa oferta.
Uma nota final
Pese embora o que comecei por
esboçar neste pequeno texto de apresentação, não se pense que os autores
presentes nesta coletânea revelam uma qualquer postura de ignorância
relativamente aos cozinhados da tradição analítica. Nem pensar. Como se revela
na leitura de pelo menos alguns dos artigos, são autores informados. Mas ao
mesmo tempo é bem verdade que apenas pontualmente alguns estudos mais recentes
sobre os problemas analisados são citados. E, na minha opinião, deviam ter
maior lugar de destaque. Não dou aqui qualquer exemplo específico, já que esta
circunstância está presente em todos os capítulos do livro. Alem de que as
bibliografias citadas revelam esse mesmo esquecimento que, na minha opinião,
empobrece a exploração dos problemas.
A edição portuguesa é de capa
dura e num formato físico muito resistente. O que favorece a obra. Um belo livro de filosofia, portanto.
Agradeço ao editor o envio desta
obra para análise e opinião.
Autores Vários, As Grandes Noçõesda Filosofia, Ed Piaget, 2003, Tradução de Ana Rabaça, Coleção Pensamento e
Filosofia (Direção de António Oliveira Cruz)