Recentemente ao passar os canais de TV vi um debate
organizado sobre o problema da eutanásia. Não tive oportunidade de assistir a
todo o debate, mas pareceu-me que alguns dos intervenientes confundiam as
definições de eutanásia. É por isso que o trabalho prévio de definir conceitos
é tão relevante em qualquer discussão minimamente organizada. Neste pequeno
apontamento vou registar as principais definições do conceito de eutanásia para
servir de auxiliar à discussão. Com as distinções feitas, a discussão torna-se
mais clara.
Etimologicamente o termo eutanásia deriva de duas palavras
gregas (eu e thanatos) que significam morte boa ou suave. Em muitos casos o
termo eutanásia também significa morte misericordiosa dado que a motivação é
agir humanamente para com uma pessoa que está a sofrer.
A segunda distinção a ter em conta é entre o que é legal e o
que é moral. Muitas vezes, como vi acontecer programa de TV, associamos o legal
e o moral. E é verdade que muitas das leis são derivações da racionalidade
moral. Mas o que é moral é muito diferente do que é legal. Para o perceber
basta pensar que nem tudo o que é de lei é necessariamente moral, como o que é
moral não tem de ser necessariamente legal. A escravatura foi durante muito
tempo legal e daí não se segue necessariamente que seja moral. Do mesmo modo
ajudar uma pessoa pobre pode ser considerado moral sem que existam leis que nos
obriguem a ajudar os mais pobres. O que é de lei é estabelecido pelo Estado ou
organização política. Já o carácter moral ou imoral de um ato depende das
razões que são oferecidas e sujeitas à racionalidade crítica, isto é, à discussão
ativa dos argumentos.
Ao mesmo tempo muitas leis acabam por influenciar o nosso
comportamento moral. E talvez daí resulte uma ligação entre legalidade e
moralidade. Com efeito, para começar a discussão com clareza, esta distinção
deve ser tida em conta na elaboração dos argumentos.
Outra distinção importante é entre eutanásia ativa e
eutanásia passiva. Se pela primeira entendemos matar deliberadamente, já pela
segunda entendemos deixar morrer. Daqui resulta uma outra distinção entre
eutanásia voluntária e involuntária. Vamos brevemente explicar cada uma das
definições, recorrendo a um exemplo para cada uma delas.
Eutanásia ativa
Morte deliberada do paciente levada a cabo por um médico ou
auxiliar e que implica, entre outros métodos, uma injeção letal seguida de um
agente paralisante o que implica uma morte sem dor física.
Eutanásia passiva
Implica deixar morrer o paciente omitindo passos necessários
para prolongamento da vida. Por exemplo, não ressuscitando um paciente de uma
paragem cardíaca. Se um médico desligar as máquinas que mantém vivo um
paciente, estará a realizar uma atividade, mas é geralmente considerado com
eutanásia passiva.
O que é relevante para a discussão é saber exatamente se a
morte é o resultado da intervenção do médico ou de alguém (eutanásia ativa) ou
apenas de deixar a natureza seguir o seu curso sem ativar meios de manter vivo
o paciente (eutanásia passiva)
Eutanásia voluntária
Implica o consentimento explícito por parte do paciente. Aqui
entra a questão do testamento vital.
Eutanásia involuntária
Implica a decisão de alguém que não o paciente sobre a sua
morte. Temos como exemplo os doentes em coma (no caso de não ter dado esse
consentimento antes) e as crianças
Quer a eutanásia voluntária, quer a involuntária pode ser
ativa ou passiva.
Os casos de eutanásia ativa (voluntária e involuntária) são
os mais discutidos hoje em dia e são legalmente proibidos em Portugal.
Muitas pessoas pensam que a eutanásia ativa não é imoral em
circunstâncias muito específicas, ao passo que outras a consideram imoral seja
qual for a circunstância. E é aqui que começa a discussão.
Deixo a sugestão de um filme que serve como partida para a
discussão. Mar Adentro (2004)
1 comentário:
Rolando, obrigada por este apontamento e pela sugestão.
Vi o filme pela primeira vez quando saiu, em 2004, e depois disso, muitas vezes mais. É excelente não só para abordar a questão da eutanásia e do suicídio assistido, mas também os valores, as relações humanas e familiares e o sentido da existência.
Só tem um senão, demora mais do que uma aula, mas vale muito a pena! O Javier Bardem está incrível no papel e o Amenábar tentou ser fiel à história de Ramón Sampedro, tanto que escreveu o prólogo do seu livro "Cartas desde el Infierno". A banda sonora e as paisagens de cortar a respiração também ajudam...
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