Algumas comparações injustas surgem por vezes em relação ao exame de filosofia. Vou tentar aqui explicar o ponto da situação.. As escolas vão disponibilizando dados estatísticos para que alguns aspetos da realidade se compreendam e melhorem. Ao mesmo tempo o ministério da educação também fornece dados a este respeito. Mas não tenho aqui disponibilidade de tempo para apresentar resultados analisando todos estes dados. Como profissional da área o meu interesse aqui é disponibilizar alguns apontamentos que devem ser tomados em consideração por quem que deseje falar do exame, principalmente quando o compara com outros exames.
1º Apesar de se manter estável há já uns anos, ainda assim o exame de filosofia é o mais instável de todos, pois é o primeiro a desaparecer quando um governo aprecia pouco os exames e regressa quando um outro governo os aprecia. Comparativamente nenhum governo teria coragem para fazer desaparecer um exame de matemática, mas vários fizeram desaparecer o exame de filosofia. Isto afeta – e de que maneira – a forma como se concebe toda uma estrutura de ensino.
2º Os alunos que fazem o exame de filosofia são em menor número do que os que fazem os exames de física ou de matemática, ainda que esse número venha a aumentar de ano para ano. A razão deste aumento é a consolidação do exame ao longo dos últimos anos. Basta que o exame desapareça durante um ou dois anos para este trabalho demorar outra vez a surtir efeitos no número de inscritos a exame.
3º Os melhores alunos seguem cursos de ciências na procura de futuros profissionais com maior estabilidade. E esses alunos recorrem mais aos exames de física, biologia ou matemática do que de filosofia, ainda que o exame de matemática seja obrigatório para os alunos desses cursos.
4º Existe um imenso mercado de explicações particulares para matemática e física principalmente. Mas esse mercado é muito tímido para filosofia. Existe ainda pouca experiência de explicadores para filosofia uma vez que dar aulas particulares de filosofia não permite ainda rendimentos como aulas particulares de física ou matemática e daí a falta de interesse nos profissionais de filosofia por esse mercado. Por outro lado ao mesmo tempo que os exames de física e matemática nunca desapareceram, o mesmo não se tem passado com o de filosofia, como expliquei mais acima.
5º A disciplina de filosofia não tem gozado do prestígio social das disciplinas de matemática ou física. Recordo que ministros anteriores até deram a possibilidade de muitas escolas reajustarem os seus horários, acabando algumas por retirar tempos letivos a disciplinas como filosofia para aumentar tempos a matemática e física. Ou seja, perante o mesmo exame, há no país alunos que se podem propor com uma carga letiva ao longo do ano bem menor que outros, o que até os coloca numa situação de injusta desigualdade.
6º Muitos alunos começam a preparar o exame de matemática ou física logo no início do ano. Basta conhecer a realidade do mercado de explicações para perceber que as salas estão cheias antes mesmo do ano começar. Mas essa não é ainda a realidade para o exame de filosofia.
7º Ainda que este aspeto seja transversal a todas as disciplinas de ensino, a média interna não tem de modo algum de corresponder de todo à média de exame. Se por exemplo se usar a medida de 70% internamente para testes e os outros 30% para medir atitudes, trabalhos de grupo, participação oral, etc... isso significa que um aluno com média de testes de 8, por exemplo, pode perfeitamente obter 10 no final do ano. E um aluno de 8 muito provavelmente vai a exame tirar uma nota de 5 ou 7. Além disso, dado que a maioria dos alunos que fazem exame de filosofia não recorrem a explicadores particulares como a maioria dos que fazem de matemática ou física, segue-se que a média dos alunos que fazem exame de filosofia, neste aspeto, seria muito mais próxima da realidade do que a dos alunos que fazem exame de matemática ou física, já que a sua média depende grandemente do mercado de explicações que tem uma dimensão bastante ampla.
Espero que estas notas ajudem a compreender melhor a realidade para desse modo poder comparar o incomparável.
2 comentários:
Concordo com a apreciação que faz. É, no entanto, de salientar que se os alunos não substituem o exame de Matemática, é porque não podem. A troca só é possível em relação às específicas bienais, com exame obrigatório no 11º ano. Não poderiam trocar os exames de Matemática ou Português pelo de Filosofia. Se assim não fosse, mais alunos realizariam o de Filosofia... :)
Claro. Eu não fiz sequer essa conta :) Mesmo assim, os que fazem exame de matemática A obrigatório são sempre menos do que os que têm filosofia no secundário, isto porque a filosofia é extensível como formação geral e a matemática não. Uma escola com 1000 alunos em que 500 têm matemática A (Ciências ou economia, por exemplo) , 1000 têm filosofia se não contarmos aqui com cursos alternativos como os profissionais. Mesmo assim, sendo que os alunos que podem fazer o exame de filosofia são em maior número, comparativamente aos que fazem exame de matemática matemática são sempre menos, ainda que menos alunos sejam obrigados a fazer o de matemática. Agora não haja dúvidas que se pudessem substituir o exame de matemática pelo de filosofia lá se ia o negócio da matemática pelo cano abaixo :)
Enviar um comentário