quinta-feira, 19 de março de 2020

Fazer escolhas em tempo de terra parada

No jornal Expresso foi publicado este interessante artigo em especial para os alunos do 10º ano, para as matérias que andamos a estudar de filosofia moral. Recomendo a sua leitura.
Kant, Stuart Mill, ou Aristóteles. Uma corrente deontológica, utilitarista, ou de virtude? Qual seguir? Agir bem em relação a si próprio e aos outros, além de contribuir para conter a pandemia, fará de si um cidadão do mundo em paz consigo próprio 
Vou mesmo ficar em casa todo o dia? Vou comprar mais comida ao supermercado? Vou publicar a minha opinião nas redes sociais? Vou bater palmas à janela às 22.00? Vou confiar nas decisões das autoridades? Nesta altura de pandemia em que somos chamados a tomar decisões individuais com impacte importante na sociedade, como vamos conseguir lidar com a complexidade, a incerteza e a necessidade de acção colectiva? Não é fácil, a nível individual, compreender como agir. Será que a ética nos pode ajudar a decidir “o que devo fazer?”. 
A ética normativa é uma disciplina filosófica que nos ajuda a fundamentar e argumentar de forma coerente as nossas decisões e acções. É isso que precisamos agora, de pensar de forma estruturada em como agir. Fazemos muitas coisas em “piloto automático”, julgamos muito os outros e achamos muitas coisas sem o necessário conhecimento. A pandemia - uma epidemia que ocorre em todo mundo, ao mesmo tempo – exige mais de nós. Exige exercícios de reflexão, de introspeção, de chamarmos à coação os nossos valores éticos. Exige responsabilidade e exige que sejamos construtivos. 
Há diferentes correntes éticas, a deontológica inspirada em Kant, a utilitarista inspirada em John Stuart Mill e a ética das virtudes inspirada em Aristóteles que assentam em diferentes estruturas de pensamento: 
A deontologia é a teoria do dever e da universalidade. Para decidir o que fazer pergunte “e se todos fizessem isto, estaria certo?” se a resposta for não, então Kant diz-lhe que o seu dever é não o fazer. “Se todos comprarem mais comida do que precisam, isso é bom?” A sua resposta dá-lhe a pista sobre se deve, ou não, fazê-lo. 
A teoria utilitarista diz que devemos agir de forma a maximizar as boas consequências e minimizar as más. Não é universal como a anterior, foca-se mais no contexto e nas consequências. “O que acontece se eu não seguir as instruções sobre a quarentena?” Se a consequência da sua resposta for uma maior probabilidade de apanhar o vírus ou contagiar alguém, Mill dir-lhe-ia que é errado. 
A ética das virtudes assenta mais na pessoa e menos na acção, dando ênfase ao carácter individual onde tão importante como a pergunta, “o que devo eu fazer?” é a pergunta de “como quero eu ser?”. Aristóteles perguntar-lhe-ia “Que tipo de pessoa é que quer ser neste contexto de pandemia?” e é a sua resposta que o ajudará a decidir o que fazer. 
Nem sempre há respostas absolutamente certas ou erradas, mas ao menos serão dadas de forma mais consciente e informada. Por isso, confie num destes filósofos, e questione ou o universalismo dos seus actos ou nas suas consequências ou em pensar que tipo de pessoa quer ser. Ou então em todos, apesar das respostas poderem não coincidir, o pluralismo ético faz parte da vida real. O essencial é conseguir fundamentar e argumentar de forma coerente o que decidir principalmente quando estamos, como agora, em contextos novos, complexos, difíceis e dilemáticos. 
Em tempos de crise podemos ainda recorrer à inspiração de grandes políticos: se nesta fase só se promete sangue, suor e lágrimas (Churchill), então não espere só o que podem fazer por si, centre-se no que pode você fazer (Kennedy) para ultrapassarmos todos, da melhor forma, esta pandemia. Mesmo se aquilo que tiver que fazer, seja não fazer nada e ficar de quarentena em casa. 
A boa notícia é que a ética tem intrinsecamente uma componente de harmonia ou felicidade e por isso agir bem em relação a si próprio e aos outros, além de contribuir para conter a pandemia, fará de si um cidadão do mundo em paz consigo próprio. Fica a ganhar duplamente. 
*Sofia Guedes Vaz, Investigadora no IFILNOVA e Presidente da Sociedade de Ética Ambiental

Link: https://expresso.pt/opiniao/2020-03-17-Etica-em-clima-de-pandemia 

terça-feira, 17 de março de 2020

Exames nacionais na Escola Jaime Moniz

Descarregar o boletim de inscrição AQUI.
Depois enviar devidamente preenchido e digitalizado para um dos endereços disponíveis para esse efeito, tal como refere a nota no site da escola (AQUI).  

1.    Descarregar o boletim de inscrição, preencher e enviar para o correio eletrónico cristinaexames@jaimemoniz.com ou fatimaexames@jaimemoniz.com



sábado, 14 de março de 2020

Estudar em casa para evitar o Covid 19


Olá alunos
Como tenho todos os vossos emails, as classificações dos vossos testes serão enviadas por esse meio em breve, talvez mais para o final da próxima semana. Os alunos do 10º ano devem começar a ler os materiais que enviei sobre Filosofia Moral. Os do 11º ano podem estar mais tranquilos, mas os que vão fazer exame devem estudar com os materiais que já vos forneci e com as indicações dadas. Com efeito vou enviar durante a semana materiais completos para a filosofia da religião, a unidade que estudaremos no terceiro período.
Este mesmo blogue que já conhecem tem secções com as matérias organizadas que podem ser um recurso para o vosso estudo. 
Qualquer dúvida ou outra questão estamos sempre, como sempre, em contacto. E protejam-se. 


segunda-feira, 9 de março de 2020

Uma pequena sugestão para uma teoria não essencialista da arte

Com as aprendizagens essenciais, as teorias da arte não essencialistas passaram a ser de lecionação obrigatória no 11º ano. Ora, se ensinamos teorias essencialistas seria redutor não abordar teorias não essencialistas. E de algum modo esta sistematização teórica beneficia alunos e o ensino da filosofia, pois lava a cara à disciplina, retira-a das imagens por vezes confusas e bolorentas com que é ensinada, além de remeter para os grandes debates filosóficos de todos os tempos sem parar num qualquer século passado. Outra questão é saber se este é o modo mais adequado de ensinar filosofia ou se é estritamente necessário que se ensine com esta sistematização no secundário. Por exemplo, na universidade nunca ouvi falar de tais coisas na disciplina de estética e o debate passou ao lado. Em seu favor andei a ler textos de autores obscuros e que nem sequer entram no debate. Isto por si só, pensando que aconteceu à esmagadora maioria das pessoas que estudaram filosofia na universidade e que são hoje em dia professores do secundário, é causador dos maiores equívocos e “ignorância” em relação ao que de interessante e profícuo tem o debate nesta questão (nas outras não foi muito diferente o curso).
Alguns elementos da teoria institucional já apareciam ocasionalmente em manuais e eram ensinados por alguns professores. Eu próprio já fazia esta distinção entre teorias essencialistas e não essencialistas e cheguei até a usar textos de Goodman para explorar um pouco mais alguns aspetos de teorias não essencialistas. Claro que com as dificuldades inerentes a um professor do secundário que tem de se tornar um semi especialista nas grandes áreas da filosofia, o que não é de si tarefa fácil ou simples. 
Ainda há pouco material sobre as teorias não essencialistas (já que para as essencialistas há algum uma vez que já se ensinavam essas teorias) e o que tem aparecido são repetições de algum trabalho que estava já feito e nem sempre didaticamente cuidadoso (dar esses materiais a alunos não os conduz à compreensão das teorias). Por isso, nós, professores, temos de traçar itinerários que ajudem os alunos a compreender os aspetos centrais das teorias e a sua pertinência. E não, nem sempre aquele truque de relacionar com o quotidiano dos alunos funciona (eu diria mesmo que quase nunca funciona, mas isso é outra conversa). 
A teoria histórico-institucional compreende-se bem se articulada com uma das insuficiências da teoria institucional na versão simplificada de Dickie, que é aquela que nos é exigida no secundário. E segundo essa se um objeto pertencer ao mundo da arte, então pode ser que seja um objeto de arte. Isto parece não explicar de todo como funciona o mundo da arte. Senão numa aula apontaríamos para a nossa garrafa de água e poderíamos dizer que uma vez pertencendo ao mundo da arte, seria uma obra de arte. Eventualmente sim, se essa garrafa for sujeita a todo um escrutínio pelas pessoas e instituições da arte. A ideia de Levingson é afinar alguns aspetos da teoria e por isso remete para o conceito de propriedade. Isto é, não basta que um objeto passe a pertencer ao mundo da arte para ser considerado arte. É preciso que o criador possua direitos de propriedade sobre esse objeto. Bem, como não possuo direitos de propriedade sobre muitos objetos, não basta assim que os inclua de algum modo no mundo da arte, para que passem a ser objetos de arte. É preciso, segundo Levingson, que tenha algum direito de propriedade sobre o objeto que se quer ver como objeto de arte. Isto para além da necessidade de ver esse objeto no curso histórico da arte, com uma intenção clara de que ele seja visto como objeto de arte. No âmbito de uma teoria não essencialista estes aspetos não são de facto de deitar fora se queremos saber o que pertence e não pertence ao complexo mundo da arte. Esta fotografia mais abaixo foi um registo feito pelo inglês Richard Long. O que ele fez foi caminhar de um lado para o outro até que a relva ficasse com aquela aspeto amachucado. No final registou em foto. Uma vez que Long não tem direitos de propriedade sobre a relva e o terreno que pisou, será que ele produziu uma obra de arte? Parece que ele teve pelo menos alguma intenção que o seu feito fosse visto como arte ao registá-lo no final de o conceber. Em que ficamos?