quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Nick Cave e as fadas más

A Margarida, aluna do 10º 47, pediu mais sugestões musicais. Nick Cave é um cantor já com muitos anos de atividade musical. É australiano, mas fez praticamente toda a sua carreira na Europa. Tocou com muitos músicos diferentes na sua banda de acompanhamento, aos quais chamou de Bad Seeds. A primeira fase da carreira de Nick Cave é mais dura, mas a fase posterior é mais suave, com lindas canções. Neste ano Nick Cave And The Bad Seeds lançou mais um disco ao vivo que é um bom punhado de excelentes canções. Fica aqui a amostra. Espero que gostem. Chama-se "No more shall we part" e é a canção que eu ia a ouvir nos auriculares quando a Margarida pediu mais sugestões de boa música. 


segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Argumentos a favor do libertismo

“O Libertismo é a perspetiva de que pelo menos algumas das nossas ações são livres porque não estão causalmente determinadas. Segundo esta teoria, as escolhas humanas não estão constrangidas da mesma forma que outros acontecimentos do mundo. Uma bola de bilhar, quando é atingida por outra bola de bilhar, tem de se mover numa certa direção a uma certa velocidade. Não tem escolha. As leis causais determinam rigorosamente o que irá acontecer. Contudo, uma decisão humana não é assim. Neste preciso momento, o leitor pode decidir continuar a ler ou parar de ler. Pode fazer qualquer uma destas coisas e nada o faz escolher uma delas [ou seja, nada o obriga a escolher uma delas]. (…)Esta forma de pensar foi defendida por diversos filósofos e propuseram-se vários argumentos a seu favor.O argumento da experiência. Podemos começar com a ideia de que sabemos que somos livres porque cada um de nós apercebe-se imediatamente de ser livre cada vez que faz uma escolha consciente. Pense novamente no que está a fazer neste momento: ler uma página que está diante de si. Pode continuar a ler ou parar de ler. O que irá fazer? Pense na sensação que tem agora, enquanto pondera estas opções. Não sente constrangimentos. Nada o impede de seguir numa direção nem o força a fazê-lo. A decisão é sua. A experiência de liberdade, poder-se-á dizer, é a melhor prova que podemos ter. (…)O argumento da responsabilidade. O pressuposto de que temos livre-arbítrio está profundamente enraizado nas nossas formas habituais de pensar. Ao reagir a outras pessoas, não conseguimos deixar de as ver como autoras das suas ações. Consideramo-las responsáveis, censurando-as caso se tenham comportado mal e admirando-as caso se tenham comportado bem. Para que estas reações estejam justificadas, parece necessário que as pessoas tenham livre-arbítrio.Outros sentimentos humanos importantes também pressupõem o livre-arbítrio. Alguém que conquista uma vitória ou tem sucesso num exame pode sentir-se orgulhoso, enquanto alguém que desiste ou faz batota pode sentir-se envergonhado. Porém, se as nossas ações se devem sempre a fatores que não controlamos, os sentimentos de orgulho e de vergonha são infundados. Estes sentimentos são uma parte inescapável da vida humana. Assim, mais uma vez, parece inescapável que nos concebamos como livres.”
James Rachels, Problemas da Filosofia, tradução de Pedro Galvão, Gradiva, Lisboa, 2009, pp.183-184 e 189-190.
No blog de Filosofia, Dúvida Metódica, os argumentos são formalizados deste modo:

Podemos resumir o argumento da experiência (por vezes designado argumento da introspecção) deste modo:

Se inúmeras pessoas têm a experiência ou sensação de ser livres, então a crença no livre-arbítrio é verdadeira.
Ora, inúmeras pessoas têm a experiência ou sensação de ser livres.
Logo, a crença no livre-arbítrio é verdadeira.

Podemos resumir o argumento da responsabilidade deste modo:

Se não existisse livre-arbítrio, então não teria sentido responsabilizar as pessoas.
Mas tem sentido responsabilizar as pessoas.
Logo, existe livre-arbítrio.



domingo, 24 de novembro de 2013

Dilema do Prisoneiro e egoísmo


Vamos imaginar que dois sujeitos, o Luís e o Aníbal são acusados injustamente de um crime grave. Um interrogador entra na cela do Luís e pede-lhe que confesse o crime. E diz que vai fazer o mesmo ao Aníbal.

Assim, há 4 resultados possíveis:

1.      Somente o Luís confessa o crime
2.      Somente o Aníbal confessa o crime
3.      Ambos confessam o crime
4.      Nenhum confessa o crime

Agora a proposta é a seguinte: Caso Luís confesse o crime (situação 1), o Luís sairá em liberdade e o Aníbal ficará preso 10 anos. Caso suceda a situação 2, acontece o inverso. Se suceder a situação 3 (ambos confessam), então ficarão ambos presos apenas 8 anos. Se suceder 4, isto é, se nenhum deles confessar, ambos continuarão presos apenas durante 6 meses.
Se analisares bem, claro que 4 é a melhor situação para ambos. Mas como é que Luís e Aníbal agiriam se fossem egoístas racionais? Acontece que se Luís for egoísta racional vai confessar o crime. E o mesmo sucede com Aníbal se for egoísta racional.
O que nos mostra esta experiência mental, é que em certas circunstâncias as pessoas retiram maiores benefícios se não agirem de acordo com o egoísmo racional.

(parte deste texto é inspirado na explicação do manual, Razões de Ser, Porto Ed)

sábado, 23 de novembro de 2013

Dilema do determinismo

Podemos afirmar que a teoria do determinismo começa com um dilema. Um dilema é quando estamos perante dois caminhos sem saber qual devemos escolher. O dilema do livre-arbítrio pode apresentar-se da seguinte forma:

Se o determinismo causal é verdadeiro, então não temos livre-arbítrio.
Por outro lado, se o determinismo é falso, então as nossas ações são aleatórias, consequência do acaso.

Mas se as nossas ações são aleatórias, então, não resultam das nossas deliberações.
Logo, em qualquer dos casos, quer o determinismo seja verdadeiro, quer seja falso, parece que não temos livre-arbítrio.
E agora?

Agora resta-nos estudar as 3 respostas ao problema e analisá-las cuidadosamente. 

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Dia Mundial da Filosofia


Determinado pela UNESCO, hoje comemora-se o dia mundial da filosofia. A filosofia é considerada por esta organização como património da humanidade. Mas o melhor que podemos fazer pelo património é preservá-lo. Só há uma forma de preservar este património, fazendo filosofia. Por essa razão deixo aqui uma questão para pensar:

Será que se existisse uma teoria sobre tudo, essa teoria poderia predizer as nossas ações e comportamentos e, nesse caso, não teríamos livre arbítrio?


Há uma resposta a este problema num livro de filosofia que levarei para as aulas e lerei a todos os alunos. 

Na nossa escola fizemos diversas atividades, nomeadamente o video que está a rodar com alguns livros de filosofia escolhidos pelos professores, assim como cartazes e placards com explicações de alguns problemas da filosofia. 

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Libertismo


Alguns alunos pensam que o libertismo defende que todas as ações são livres. Tal não é verdade. Senão vejamos: estudaste já que a negação de uma proposição tem de inverter o seu valor de verdade, ou seja, se a proposição a negar for falsa, a sua negação é verdadeira e se a proposição a negar for verdadeira, a proposição negada é falsa.
Agora vejamos o que defendem os deterministas radicais:
Todas as ações estão determinadas

Se negássemos esta afirmação por “Nenhumas ações estão determinadas”, é fácil de ver que ambas podem ser falsas ao mesmo tempo, pelo que a negação que os libertistas fazem do determinismo radical não pode ser “nenhumas ações são determinadas”, mas antes: “algumas ações não são determinadas”. E é exatamente isto que defendem os libertistas. 

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Determinismo radical no Sims

Na verdade nunca joguei o Sims, mas sabendo mais ou menos do que que se trata, fiz uma analogia na aula entre o determinismo radical e o jogo Sims. Se o determinismo radical for verdadeiro, comportamo-nos como se fossemos personagens do Sims que pensam que são livres, mas na verdade todas as suas ações estão causalmente determinadas. Claro que não devemos de todo levar esta analogia a sério, pois o determinismo que falamos no problema do livre arbítrio é a causalidade científica.


segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Peter Singer: O "porquê" e o "como" do altruísmo eficaz

Nas aulas falamos que uma das teorias que procuram explicar a motivação para a ação é o egoísmo psicológico. Duas objeções principais foram apontadas ao egoísmo, a primeira que refere que o prazer que obtemos de praticar determinadas ações é apenas o efeito e não a causa de uma ação. Outra das objeções são as ações que parecem ser verdadeiramente altruístas e não egoístas. Uma das boas formas de compreender o altruísmo é assistir a este pequena palestra do filósofo altruísta Peter Singer. Vale bem a pena.

sábado, 16 de novembro de 2013

Duas sugestões musicais

Deixo aqui duas sugestões musicais, uma bebezinha e outra muitíssimo mais madura. Ambas são boas colheitas. A bebezinha é dos Arctic Monkeys e a adulta é de Anna Calvi. Espero que gostem. 




quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Como fazer filosofia

Vale a pena ler o texto de Nigel Warburton que publicamos no nosso manual on-line. Nesse texto Warburton explica como se faz filosofia, em discussão e não somente a decorar as ideias dos filósofos. Vale a pena ler, pensar e aprender.




Fica o aperitivo:
A filosofia ocidental tem as suas origens na conversação, na discussão cara-a-cara sobre a realidade, o nosso lugar no cosmos e sobre como devemos viver. Começou com um sentimento de mistério, espanto e confusão e com o poderoso desejo de alcançar além das meras aparências para descobrir a verdade ou, se não isso, pelo menos algum tipo de sabedoria ou equilíbrio.

Somos responsáveis pelo que fazemos?

Fica aqui a apresentação que serviu de mote a uma das nossas aulas sobre o livre arbítrio. Trata-se de uma inspiração do filósofo inglês Julian Baggini


Peter van Inwagen sobre o problema do livre arbítrio

Vale a pena ver este vídeo do filósofo Peter Van Inwagen sobre o problema do livre arbítrio. Vimos em algumas aulas este vídeo. A entrevista foi feita pelo professor Aires Almeida.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Uma sugestão musical para os meus alunos

Os Radiohead são uma banda inglesa. Liderados por Tom York tem já um punhado de bons discos publicados. Weird Fishes pertence ao disco In Rainbows. Vale a pena descobri-los pois são uma das bandas da atualidade que melhor conseguiram imprimir intensidade emocional nas suas canções, para além de revelarem um excelente bom gosto estético.

Crença, o que significa em filosofia?

No sentido comum crença significa a pressuposição que algum deus existe ou não. Dizemos: “acredito em Deus” ou “não acredito em Deus”.
Em sentido filosófico, crença implica a atitude proposicional perante o mundo, isto é, a expressão por proposições do que acreditamos sobre o mundo. Expressões como as seguintes expressam crenças:

O planeta terra é redondo
Existem unicórnios
A aula de filosofia é na sala A
Paris é a capital de França
Funchal é a capital da ilha da Madeira

As crenças são expressas em proposições, razão pela qual dizemos que afirmar “Funchal é a capital da ilha da Madeira” é uma proposição verdadeira ou falsa. Não esqueçamos que uma proposição é o conteúdo do que pensamos e que expressamos numa frase declarativa com sentido e tem valor de verdade (pode ser verdadeira ou falsa).

Compreender o que é uma crença é relevante pois é a primeira condição para que haja conhecimento, isto é, para que possamos afirmar que sabemos algo. Claro que a crença, para ser conhecimento, tem de ser verdadeira e precisa de ser justificada, mas sem crença não há, sequer, conhecimento.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Clorofila e resultados dos testes de filosofia

Nesta semana entreguei e fizemos a correção do primeiro teste de filosofia. Alguns alunos deslizaram e não conseguiram classificações positivas. O objetivo é que todos alcancem resultados positivos. Assim, funciona como uma ida ao médico. Quando estamos doentes vamos ao médico. Perante os sintomas o médico diagnostica a doença e aposta numa receita. A aposta da receita é o resultado do conhecimento do médico. E a receita nem sempre resulta. Mas nenhum médico deixa o paciente sem receita. Analogamente o professor tem de passar uma receita para alcançar o êxito. Há múltiplos fatores que concorrem para o resultado num teste, incluindo o fator sorte. Mas mesmo na invariabilidade toda, há alguns pontos que são seguros. Assim, estar atento nas aulas e participar ativamente nas mesmas, bem como ler e estudar são pontos mais seguros do que confiar na sorte cega. Certamente nenhum aluno consegue alcançar classificações altas confiando apenas na sorte.
Nas aulas tracei três pontos que devem ser seguidos por todos alunos para alcançar o êxito. Os dois primeiros são fáceis de conseguir e o último é o mais complicado. Os primeiros são:
1)      Atenção nas aulas
2)      Dedicar pelo menos uma hora de estudo por semana à disciplina
O último é o tal mais complicado:
3)      Mudar a nossa atitude perante o mundo e a própria vida
O ponto 3) é o mais difícil porque o mais certo é que vai chocar com as nossas crenças mais básicas que adquirimos ao longo da nossa vida. O exemplo que dei nas aulas é o que a seguir sintetizo.
Vamos supor que a Joana está no café a beber uma chávena de chá. De repente e sem intenção esbarra com um movimento do braço na chávena e ela cai da mesa e parte. O problema da Joana passa a ser a chávena partida e a chatice de ter de pagar outro chá. Se a Joana mudar o foco da suas crenças pode fazer uma questão mais elaborada: mas por que raio a chávena caiu para o chão? Afinal, porque caem os objetos sempre na direção do chão? Se a Joana quiser a resposta a este problema pode começar a estudar um pouco mais de física, conhecer Newton e saber como funciona a gravidade. E o mesmo acontece com a filosofia. O luís deu um pontapé ao João. O Francisco acha que o Luís fez justiça e a Maria acha que não. E discutem entre si as razões que cada um apresenta para conceber se o Luís foi justo ou não. Mas se quer o Francisco, quer a Maria forem curiosos, vão querer saber o que é que fundamenta as suas razões, isto é, vão querer saber o que é a justiça. E para saber isso vão estudar filosofia. É por isso que o terceiro ponto é o mais complicado, pois exige uma mudança do nosso comportamento no modo como olhamos para o mundo e confiamos nas nossas crenças.
Todos nós possuímos crenças em relação aos problemas básicos, mas nem todos temos curiosidade para ir mais além. Quando vamos mais além, somos movidos pela chave do sucesso, a saber, a paixão que nos move em direção ao conhecimento e à filosofia.

Uma boa estratégia para passar a investigar as questões básicas filosofando é recordarmos as perguntas que fazíamos quando fomos crianças. O exemplo que vos dei foi a pergunta do João Francisco, o meu filho, de 5 anos, quando ainda ontem me perguntou: “pai, por que é que as plantas precisam de água?”. Esta é uma questão científica, mas não tarda nada e o João vai fazer questões filosóficas. Todas as pessoas fazem. Mas nem todas são levadas pelo impulso da curiosidade. Saber o que aconteceu à curiosidade, o que a matou, é já um outro problema. 

terça-feira, 5 de novembro de 2013

O que vamos estudar? Filosofia da ação e livre arbítrio

Neste momento estudamos a ação. Não estamos propriamente a fazer filosofia da ação, mas antes a tentar arranjar uma boa definição de ação que nos permita avançar com alguma segurança para a discussão do problema seguinte, o problema do livre arbítrio.
Assim, começamos por distinguir ações de meros acontecimentos, mesmo que nos tenhamos deparado com algumas situações em que é difícil determinar se estamos perante uma ação ou perante um acontecimento.
De uma forma geral definimos ação como um acontecimento que um agente faz, com intenção. Para determinarmos como saber se uma ação é intencional estabelecemos que tem de obedecer pelo menos a uma descrição verdadeira, isto é, que possamos evidenciar pelo menos uma crença e um desejo de agir, se quisermos, temos de enunciar um motivo. Assim, sabemos que respirar não pode ser uma ação, mas estudar filosofia é uma ação.

Vamos então supor que a Maria está a tocar piano. É simples perceber que tocar piano, ou pelo menos colocar os dedos sobre o piano, é uma ação que a Maria realiza. Vamos imaginar ainda que a Maria acordou os vizinhos com o som produzido pelo seu piano. Será que a Maria praticou uma ou duas ações? O que pensas disto?


Definir a ação vai-nos permitir entrar no problema do livre arbítrio. Se o universo é fisicamente determinado, será que somos livres quando agimos, ou a nossa ação não passa de uma ilusão?
Vamos estudar três respostas a este problema, duas delas incompatibilistas (que defendem que o livre arbítrio é incompatível com o determinismo) e uma delas compatibilista (que defende que o livre arbítrio é compatível com o determinismo)

Incompatibilistas:

·         Determinismo radical
·         Libertismo

Compatibilistas:

·         Determinismo moderado


Estudaremos cada uma destas teorias nas aulas, bem como a sua discussão. 
O vídeo que te é proposto neste post é do filme The Matrix. Nele coloca-se uma situação interessante relacionada com o livre arbítrio. Se puderes ver o filme todo, é interessante. 

sábado, 2 de novembro de 2013

Então e a filosofia não depende da opinião de cada um?


Existe uma ideia que tem tanto de comum como de errada de que a filosofia não se define, pois depende da opinião de cada pessoa. Se o Asdrúbal passar uma rasteira ao Aníbal, algumas pessoas vão pensar que o Asdrúbal foi injusto com o Aníbal e outras vão ainda pensar que o Asdrúbal fez muito bem e foi muito justo, pois o Aníbal andava a merecê-las. Segue-se daí que não exista um conceito de justiça que esteja para além da opinião das pessoas? Claro que não.
Se alguém te dissesse que é cientista e tem uma opinião para resolver um problema, provavelmente acharias estranho, pois sabes bem que as teorias dos cientistas não resultam das opiniões pessoais dos cientistas, mas são o resultado da sua investigação sistemática e do seu estudo com a equipa de cientistas. E o mesmo acontece com a filosofia. O que os filósofos fazem é muito mais do que dar a sua opinião sobre um problema. O que eles fazem é tentar avançar teorias que resolvam problemas. Ora, isto é muitíssimo mais do que dar a sua opinião. Claro que muitas das teorias dos filósofos e dos cientistas para resolver problemas partem das suas próprias opiniões sobre os problemas. Mas fazer teorias é muito mais elaborado que dar opiniões. A diferença é que quase sempre damos opiniões sem estudar, mas não podemos fazer teorias minimamente aceitáveis sem estudar. É talvez por isso que, em ciência, por exemplo, se nos perguntam se deixarmos cair um livro e uma bola de papel ao mesmo tempo, qual é o que cai primeiro, dizemos que é o livro pois é mais pesado. Se fizermos a experiência, o que verificamos é que a nossa opinião estava errada. E o mesmo sucede na filosofia. Se nos perguntarem se os animais têm direitos como têm os seres humanos, dizemos que não. Mas se investigarmos um pouco, estudando cuidadosamente algumas teorias dos filósofos, começamos a pensar que a nossa opinião possa estar errada, pois há boas teorias que nos dão boas razões para pensar o contrário do que era a nossa opinião.
Desfazer esta confusão é essencial senão os alunos que iniciam o seu estudo de filosofia no 10º ano pensam que vão para as aulas apenas dar a sua opinião pessoal sobre os problemas.
A diferença principal que nos interessa aqui saber entre filosofia e ciência, é que ao passo que uma boa teoria em ciência gera consenso na comunidade de cientistas, isso é mais difícil acontecer na filosofia. Em regra temos várias teorias que se disputam entre si. Mas isto não acontece porque os filósofos sejam tipos teimosos e que lhes apetece passar o tempo a contradizer os outros filósofos. Isto acontece porque os problemas da filosofia são difíceis de resolver. É difícil saber, por exemplo, qual a coisa certa a fazer do ponto de vista moral, ou saber se é possível ter uma boa definição de arte, ou saber se os números possuem uma existência real como pensamos que possuem quase todos os outros objectos.
Isto por si só exige um estudo muito sério das teorias dos filósofos e ao mesmo tempo, devagar, começamos também nós próprios a tentar resolver esses problemas. Esta é a natureza da filosofia. Mas para a fazer é preciso muito mais do que nos sentar numa cadeira numa aula de filosofia e dizer a primeira coisa que nos apatece sobre os problemas. Para isso não precisávamos das aulas de filosofia, pois é isso mesmo que fazemos todos os dias na mesa do café com os amigos. Quando estamos a conversar passamos em revista muitos dos problemas da filosofia, isto porque eles são fundamentais para a vida dos seres humanos. Assim, damos opiniões sobre justiça e injustiça, o certo e o errado, o belo e o feio, a existência de divindades, etc. pelo contrário muito raramente falamos da lei da gravidade, ou da massa dos objectos, etc. isto porque a ciência anda à nossa volta, mas não são problemas que preocupem as pessoas no seu dia a dia. Talvez isso seja assim porque não sabemos fazer ciência. Mas sabemos mais ou menos argumentar. E por isso achamos que isso basta para fazer filosofia, como se saber fazer contas bastasse para fazer de nós matemáticos. Tal como em matemática é interessante fazermos exercícios, também o mesmo acontece na filosofia.
Em conclusão: é por isso que a definição de filosofia não depende da opinião de cada um, mas do estudo sistemático e atento da própria filosofia e das teorias dos filósofos. De resto, como aprendeste nas aulas de filosofia podemos não conseguir uma definição explícita (por meio de condições necessárias e suficientes) de filosofia, mas também não temos definições explícitas da maioria das coisas à nossa volta. Daí não se segue que:
a)      Não podemos definir implicitamente a filosofia, fazendo-a, por exemplo.
b)      Não a possamos caracterizar em 2 ou 3 minutos.

Segue-se daqui que é errado pressupor que a filosofia depende da opinião de cada um.