terça-feira, 29 de setembro de 2009

Livraria Capítulos Soltos

Na cidade nortenha de Braga abriu recentemente uma livraria que merece o meu destaque já que os proprietários simpaticamente me enviaram uma fotografia ostentando orgulhosamente o escaparate dedicado à filosofia. Nele, espreitando pela foto, podemos ver boas obras de filosofia. Mas o destaque aqui no FES é merecido dado a vaidade com que os livreiros me mostraram o seu trabalho com a filosofia. Da minha parte as maiores felicidades para este projecto. O blog da livraria pode ser visto clicando aqui.

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Novidade Guerra & Paz

Um dos livros centrais do século xx, da filosofia da ciência é editado tardiamente em língua portuguesa pela Guerra & Paz. É nesta obra que se faz a defesa dos argumentos mais poderosos sobre o relativismo na ciência.

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segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Saber vender livros

O colega Daniel deixou um comentário sobre os escaparates de filosofia. Recordo aqui um texto meu já publicado. Hoje mudaria alguns tópicos, mas manteria o essencial.

SABER VENDER LIVROS i

É dado seguro que o mercado livreiro em Portugal é limitado. Há várias razões que podem explicar esta realidade, entre as quais, julgo ser uma das principais, o espaço geográfico e cultural no qual se fala a língua portuguesa. Uma das outras razões, que pode ser considerada principal, é o facto dos consumidores comprarem poucos livros. Mas essa é a realidade que acontece com muitos outros produtos. Para que os produtos se vendem é necessário passar pelas regras elementares do marketing e da comunicação no sentido de fazer chegar o produto aos consumidores.


A maior parte dos consumidores não possuem autonomia suficiente para procurar o livro x ou y, a menos que se trate da sua área específica de formação. E o chamado público geral como é que chega ao conhecimento dos livros que lhe são destinados? Só mesmo preparando uma boa montra para os livros. Neste sentido defendo que é possível vender mais livros se alguns erros elementares de venda forem evitados. Os dados que aqui vou comentar referem-se somente à minha experiência dentro das livrarias e do modo de actuação dos livreiros em Portugal, não possuindo qualquer estudo que me permita tecer comentários mais sustentados. Com efeito estou consciente que não são necessárias leis nem estudos científicos para perceber determinados aspectos da realidade e que nos podemos orientar somente pela prática e experiência. Um desses erros perante o qual sou muito crítico prende-se com o modo como os livreiros expõem os livros ao chamado público geral. Por público geral entendo aquela massa de pessoas que sentem necessidade de ler e conhecer livros acessíveis e bem escritos sobre uma determinada área mas que, não sendo a sua área de conhecimentos, se sentem perdidos em como encontrar as leituras adequadas ao seu nível de compreensão. Entre esse público geral também podemos classificar aqueles grupos de pessoas que habitualmente não compram livros, mas que essa necessidade pode ser criada com uma divulgação ampla e adequada de livros. Claro que a divulgação de livros se merecesse por parte dos media ampla divulgação, teríamos em grande parte o problema resolvido, mas após umas décadas de TV não podemos ter esperança que esse seja o meio para fazer chegar os livros às pessoas e, no caso português, a imprensa escrita também não constitui grande ajuda. Não existe, por exemplo, uma revista dedicada aos livros que possua ampla projecção. Os jornais que existem e divulgam livros, fazem-nos para os umbigos dos críticos e das chamadas elites intelectuais. Aqueles que poucos hábitos de leitura têm ficam a ver navios. E os programas governamentais de apoio à leitura também não produzem grandes resultados no aumento de vendas de livros. No caso dos livros as novas tecnologias ainda não são concorrência, uma vez que a pirataria não consegue reproduzir a preços competitivos o valor do objecto e a sua manuseabilidade. Desta forma, cabe aos editores e livreiros criar as condições para que os livros se vendam.


Os Livreiros

Se entro numa livraria para comprar um livro de filosofia, movo-me com todo o à vontade para dispensar qualquer ajuda ou montra que mo apresente. Nessa área, que é a minha, sei o que quero. Mas o mesmo não acontece se procuro, por exemplo, saber mais um pouco de física. E se procuro saber mais um pouco de física, que não é a minha área de formação, por certo que não vou comprar um livro específico de física. Tenho de ter acesso, por exemplo, a um livro de introdução à física, sem a linguagem formal e técnica que uma ciência como a física exige em altas sofisticações. O mesmo acontece se pretendo comprar um livro de puericultura para obter uns conselhos práticos para educar o meu filho. Ao entrar na livraria, em princípio, não me dirijo às prateleiras dos livros das áreas que não são as do meu interesse. Mas aqui é que cabe a questão, não serei eu capaz de me interessar por física? Claro que sim, se os livros de introdução a essa ciência me mostrarem o quanto ela é importante na minha vida pessoal. Um livro de física é até muito mais importante na minha vida prática e pessoal do que um livro de magia. Com efeito, as pessoas compram mais livros de magia do que de física. Mas existe uma razão para que isto aconteça: é que os livros de magia entram-me pelos olhos dentro nas livrarias, ao passo que os livros de física que eu poderia ler, estão escondidos nas prateleiras de baixo, nas quais me tenho de curvar para os ver. Claro está que eu não posso procurar aquilo que não sei sequer que existe. Muitos leitores já devem estar a torcer o nariz, mas isto é a realidade que acontece em algumas livrarias, entre as quais, a Fnac. Tomando o exemplo da Fnac que melhor conheço e mais frequento, a da cidade onde vivo, o Funchal, quando me dirijo ao escaparate de divulgação científica, o que é que lá encontro? Livros técnicos de ciência, ao passo que os livros de divulgação científica como é o caso dos da Ciência Aberta da Gradiva estão escondidos. Admirado com esta realidade, quando questionei os responsáveis por tal, explicaram-me que tinham celebrado um protocolo com a universidade da Madeira e por essa razão tinham de expor os livros técnicos de ciência. Ora bem, os alunos universitários têm de comprar os livros técnicos porque os professores os recomendam. Por que razão então têm de os colocar no escaparate principal? Isto não faz sentido algum e só me prova que os livreiros são os primeiros agentes a não saber vender livros. Um consumidor que não saiba nada de ciência, ao olhar para aquele escaparate, jamais se vai interessar pela ciência, não sentindo qualquer proximidade com aqueles títulos. Mas não é isto que se passa com os livros de introdução à ciência que, entretanto, estão escondidos.
Um outro caso recente exemplifica a confusão que os próprios livreiros podem lançar nos consumidores de livros. Numa livraria observei que a filosofia estava classificada ao lado da religião, Filosofia / Religião. De imediato, numa tentativa sempre pedagógica, indaguei o responsável pelo serviço porque razão estava na prateleira a filosofia associada à religião. O responsável respondeu-me que historicamente os filósofos eram também religiosos. Ora o que expliquei ao responsável é que tal ideia é falsa e historicamente errada. Primeiro porque a filosofia surge exactamente com o propósito de questionar a verdade revelada pelos mitos divinos. Segundo porque até é verdade que uma boa parte dos filósofos estiveram ligados à instituição religiosa, principalmente na idade média, mas tal aconteceu porque era a única garantia que tinham para poder estudar. Além do mais, nesses mesmos períodos da história, qualquer estudioso, da química à física ou biologia, medicina, pintura, etc… estavam ligados à instituição religiosa, pelo que a livraria deveria, então, apresentar as classificações seguintes: Religião/Ciência, Religião/Literatura, Religião/Pintura, etc… O leitor desinformado tende a fazer confusões sobre uma área do saber como a filosofia, pressupondo que a filosofia é uma matéria entregue à religião, o que é falso. Felizmente este episódio acabou bem e o livreiro resolveu isolar a filosofia da religião. Outra questão prende-se com a arrumação dos livros. Por exemplo, recentemente a Bizâncio publicou a tradução do livro de Nigel Warburton, o que é a arte?. Em muitas livrarias é certo que vamos encontrar este livro na secção de artes, quando se trata de um livro da filosofia da arte, ainda por cima uma introdução a algumas das teorias contemporâneas da filosofia da arte. O livro organizado por Pedro Galvão, A ética do Aborto é encontrado em sociologia, quando, na verdade, se trata de um livro de filosofia moral ou ética aplicada. Nem sempre é fácil encontrar o livro de Peter Singer, Como havemos de viver (Dinalivro, 2005), arrumado nas secções de filosofia. Imagino que estes casos se passem de modo semelhante nas outras áreas do saber, muito embora eu esteja mais sensível ao caso da filosofia. É lamentável que isto aconteça quando estes livros se destinam a informar o leitor comum, não sendo requisito qualquer conhecimento prévio de filosofia. Mas o disparate ainda é maior quando observo que no escaparate principal das livrarias, em filosofia, encontro publicações altamente especializadas de filosofia que só interessam a quem sabe o que procura. Os escaparates destinam-se ao grande público e não aos públicos específicos. Isto é tanto mais razoável se pensarmos que em Portugal a venda de livros é um negócio exíguo. E ainda mais razoável é pensar que o dinheiro obtido pelas editoras com edições mais comerciais, poderia ser canalizado para sustentar publicações mais específicas que, dada a sua natureza, se vendem em menor número. Não se compreende então por que razão uma livraria tem o livro de Nigel Warburton escondido, mas exibe um qualquer livro de filosofia com um título cheio de pompa e circunstância que ninguém vai comprar. Só há uma explicação possível: os vendedores desconhecem o que estão a vender. Mas para conhecerem bastaria informar-se junto dos editores. Nem sequer exige muito esforço. Mas existe uma hipótese ainda mais subtil para este acontecimento e que desresponsabiliza parcialmente os livreiros, aspecto esse que se prende com o formalismo a que está voltado, desde sempre, o ensino da filosofia em Portugal. Qualquer livro com um título mais comum como “o que é a arte” ou, “como havemos de viver?” é, desde logo, classificado como sendo um livro de sociologia, por exemplo e nunca de filosofia. Um livro de filosofia teria de ter um título com, pelo menos, dois kilómetros e dificilmente decifrável pelo leigo. Como aqui defendo, nada mais disparatado.


Os editores

Esta é a outra face da mesma moeda, a política editorial dos próprios editores. Não faz sentido que os editores continuem a apostar em edições demasiado específicas quando não são acompanhadas por edições que divulguem as diversas áreas do saber. Sem dar os primeiros passos, como é que é possível dar os últimos? As edições especializadas tem de existir, mas que fazer com elas se não tivermos aquelas que transmitem o saber para os que nada sabem do assunto? Outro problema que aqui coloco prende-se com as opções de edição, muitas das vezes, erradas e comercialmente inviáveis. Porque é que traduzimos obras que já não estão no centro das discussões filosóficas, quando as que estão nem sequer se traduzem? O exemplo recente das Edições 70 é paradigmático, reeditando parte do seu fundo de catálogo de filosofia com obras que não traduzem os trabalhos mais interessantes na área. Claro está que não posso esquecer que a tradução dos clássicos é da maior importância. Sem o conhecimento dos clássicos é impossível compreender os contemporâneos. Mas o que se passa é que muitos editores publicam obras que são paralelas. Recentemente a Asa publicou um livro de inytrodução à filosofia de Stéphane Ferrett. Ora bem, este livro é escrito por um francês, para o público francês, para divulgar a filosofia anglo saxónica, uma vez que o autor doutorou-se em filosofia em Oxford e viu as necessidades de upgrades filosóficos na cultura francesa. Daqui não se entende a opção da Asa em traduzir do francês essa pequena obra, quando as temos às centenas directamente da fonte, com autores a escreverem em língua inglesa.

O caso “Mundo de Sofia”

Publicado em Portugal pela primeira vez em 1995, o Mundo de Sofia de Jostein Gaarder vai já, até 2006, na sua 27ª edição. É um caso raro de sucesso de vendas em Portugal e trata-se de um romance que expõe parte significativa da historiada filosofia. O que é que explica tal sucesso? O interesse espontâneo do público geral pela filosofia? Não é esta a explicação mais plausível. O Mundo de Sofia vende-se bem porque é um livro de introdução à filosofia (por sinal, já nem é o melhor disponível em língua portuguesa) que os professores de filosofia divulgam nas suas aulas no ensino secundário. Quererá isto dizer que se os professores de filosofia divulgassem outros livros, poderíamos ter mais sucesso nos livros de filosofia? A resposta é um redondinho sim. E também quer dizer que os professores devem e podem ser agentes importantes na divulgação de livros. Haverá sempre algum leitor que esteja a pensar que assim se transformavam os professores em vendedores de livros. Ora bem, tratando-se de livros de interesse científico e educacional, com uma forte vertente pedagógica, qual o problema? Será que também podemos acusar os professores de vendedores de giz, cadernos e esferográficas ou máquinas de calcular? De certeza que os alunos agradecem aos professores que lhes recomendem livros adequados para a sua idade e nível de compreensão de conhecimentos. Eu faço-o sistematicamente e observo que, indirectamente, vendo muitos livros. Que livros recomendo? Bem, posso satisfazer a curiosidade ao leitor. Divulgo livros como as introduções à filosofia escritas para gente jovem como as de Thomas Nagel e Nigel Warburton, publicados na Gradiva. Mas há outras igualmente interessantes como a de Daniel Kolak e Raymond Martin, sabedoria sem respostas, uma breve introdução à filosofia (Temas & Debates, 2002). Porquê estas e não outras? Porque respeitam dois critérios: não exigem conhecimentos prévios e introduzem os jovens no mundo dos problemas filosóficos de forma correcta e consistente. Mas recomendo livros de ciência, como alguns títulos da Ciência Aberta, mesmo pensando que devem ser os professores de física a recomendar os livros de física, ou de biologia a fazer o mesmo com os livros introdutórios da sua área. Este convívio com livros nas aulas produz muitos mais leitores do que possamos pensar. Mas é preciso lê-los para os saber divulgar. Era interessante a ideia dos livreiros e editores estabelecerem relações de proximidade com as escolas. A Coca Cola procura fazê-lo. As marcas de produtos tecnológicos como as Playstations fazem-no. E o sucesso das suas vendas deve-se a essa actuação. Não vejo razão para que tal não se possa fazer com os livros. As escolas é onde se formam os leitores. E não chega o formalismo com que se ensinam as obras para despertar interesse pelos livros. É preciso muito mais. É precisa uma estratégia de comercialização de livros que produza melhores resultados.

Conclusão

Os livros são objectos que não possuem qualquer privilégio. Como tudo no mundo, também os há bons, mais ou menos e maus e, pior que tudo, os muito maus. Mas é preciso fazer com que cheguem às pessoas. É preciso comercializá-los. A cultura não vive do ar, mas quando vendida em boas doses, é a actividade mais democrática que existe. Torna as pessoas mais exigentes e mais responsáveis, acima de tudo, mais actuantes. E esta razão, sendo simples, é suficiente para explicar o que é necessário fazer pelos livros.


Atenção: FpC - Alteração

Sem título

sábado, 26 de setembro de 2009

Cérebro em 3

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Estes são os livros que mais companhia me vão fazer nos próximos meses.

José Gil e o papel do professor



Fui aluno de José Gil na disciplina de Filosofia Moderna, quando me licenciei em filosofia. Gostei muito do trabalho dele como professor. Já não gosto assim tanto do trabalho dele como filósofo. Mas é verdade que é uma das únicas figuras da filosofia que dá a cara publicamente. Nesta entrevista, José Gil dá a sua versão, próxima da realidade, das razões que levam os bons professores a desejar sair do sistema.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Afinal não há introduções sérias de coisa alguma!!!

41ApRsK0JyL._SS500_ Este ano lecciono psicologia ao 12º ano. Fui surpreendido por uma pergunta de uma aluna, habituada que foi a tal tarefa o ano passado quando foi minha aluna em filosofia: “Professor, recomende uma introdução geral à psicologia para lermos?”. De imediato me lembrei da minha pequena biblioteca constituída no meu segundo ano de professor, quando leccionei pela primeira vez esta disciplina. Entre os manuais que comprei na altura, a maioria são demasiado técnicos para seduzir um jovem para a disciplina. Lembrei-me do “Psicologia” de Jorge Correia Jesuíno, que está a meio caminho entre o livro técnico e o livro de divulgação, publicado na altura numa colecção da Difusão Cultural, que também inclui um volume dedicado à filosofia da autoria de Manuel Maria Carrilho. Mas temi que esse livro estivesse já desactualizado já que passaram uns bons anos desde a sua publicação. O mais impressionante é que os escaparates das livrarias estão cheios de livros de pseudo psicologia, os chamados livros de auto ajuda, mas com total ausência de introduções à psicologia que sejam sérias e dignifiquem a disciplina, para além de a divulgar ao público em geral. Isto faz-me crer que a generalidade das pessoas não têm só uma concepção infeliz da filosofia, como também a têm da psicologia e, provavelmente, da ciência em geral. E muitos dos problemas bibliográficos que pensamos ser exclusivos da filosofia, a verdade é que não o são e áreas há em que a fome e miséria é ainda mais aguda. Pelo menos os livros de pseudo filosofia ainda não abundam nos escaparates de filosofia (pese embora para lá vão parar alguns de religião e espiritismo ou patetismo místico). Com efeito, uma busca no Amazon americano e inglês deu-me logo a entender que boas introduções à psicologia abundam no mercado. Nem quero imaginar as outras áreas.

Foucault, O pensamento e a pessoa

A editora Texto & Grafia já publicou entre nós obras de filósofos como Kant e Clive Bell. Desta vez, a aposta vai para um estudo sobre o filósofo francês Michele Foucault.

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Refutar o consequencialismo

Um leitor escreveu-me a pedir informações se existe em língua portuguesa alguma bibliografia de objecção aos principais argumentos expostos por Peter Singer. E existe. Recentemente a editora Principia, publicou duas obras de David Oderberg, nas quais há um retomar dos princípios da ética deontológica, tentando refutar as linhas gerais da ética consequencialista. Clicar aqui para mais informações.





quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Quem deve leccionar Área de Integração

Recentemente iniciei uma troca de argumentos com um colega de outra área disciplinar sobre a disciplina de Área de Integração e a que grupo disciplinar essa disciplina deve ser entregue. A discussão foi aberta e inteligente. Ficaram no ar algumas conclusões e muitas dúvidas. Em causa estão questões como: o programa de AI é disperso, pelo que tem unidades leccionáveis por várias áreas, sendo as principais, filosofia, história, geografia, economia e relações internacionais. Do ponto de vista da organização da carga horária quem mais perde é indubitavelmente a filosofia, por uma razão especial: a filosofia é de carácter obrigatório nos cursos gerais. Nos profissionais não existe filosofia. Com cerca de metade dos alunos do secundário a frequentar o profissional, creio que nem é necessário fazer grandes contas para perceber qual o grupo profissional que mais perde. Depois há ainda a considerar um elemento: se a AI não é filosofia (e não é) então o grupo de filosofia não tem de a ensinar. Mas a AI também não é geografia, nem história, nem nada em especial e tudo ao mesmo tempo. Então qual a razão para os docentes de filosofia ficarem parados a assistir outros grupos a ocupar a disciplina e a criar mais emprego para os seus grupos desse modo? Nos contactos que estabeleci com alguns grupos editoriais pude apurar sem grande esforço que os manuais têm sido elaborados por pessoas de várias áreas, mas maioritariamente por pessoas ligadas à filosofia. Ora, será que os profissionais da filosofia não querem leccionar AI, mas elaboram materiais para outros grupos a leccionar? A páginas tantas parece que o mesmo argumento para não leccionar a disciplina encaixa em todas as áreas e, ao mesmo tempo, o mesmo argumento para a leccionar, também serve aos grupos disciplinares em disputa. Se o critério científico, ao que parece, não pode presidir à escolha do grupo disciplinar para leccionar AI, que critério então deve ser usado? O que pensa o leitor disto? Era importante relançar a discussão. Que critérios devem presidir à atribuição da disciplina de Área de Integração a um grupo disciplinar? Agradeço a colaboração dos leitores.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

DEF – Dicionário Escolar de Filosofia

Acaba de me chegar às mãos a 2ª edição do DEF – Dicionário Escolar de Filosofia (Plátano, 2009), org. Aires Almeida. Tive o prazer de colaborar nesta edição lendo e sugerindo algumas alterações em alguns artigos novos. Ela está muito aumentada em relação à primeira edição e o resultado é o de uma clara melhoria do trabalho anteriormente feito. É uma ferramenta para ter sempre à mão.

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A primeira aula de filosofia

nci_classroom_2_imagelarge Ouço dizer muitas coisas sobre uma primeira aula. Entre as mais convencionais é que nesta aula as regras devem ser desde logo claras. De acordo. As regras são iguais para todos e é conveniente que se perca algum tempo a explicitá-las. Depois existem outras formalidades que podem ser cumpridas na primeira aula, como as habituais apresentações e enunciação de critérios de avaliação da disciplina. Alguns professores começam logo na primeira aula a fazer uma abordagem ao programa da disciplina. Ontem dei uma primeira aula a uma turma de filosofia do 10º ano ( o ano lectivo na Madeira iniciou esta semana). Alguns destes alunos têm somente 14 anos e frequentam pela primeira vez o ensino secundário. Após o cumprimento de algumas formalidades, comecei por questionar os alunos sobre as suas expectativas quanto à filosofia. É natural que na primeira aula algum silêncio se possa fazer sentir, mas aproveitei o tempo para dar uns lamirés sobre o assunto. Devo dizer que não sou muito formal nem na primeira aula. Tenho lido algumas recomendações no sentido, por exemplo, do professor não se “armar” em engraçadinho. Correcto, mas não dispenso algum humor e boa disposição. Há sempre um ponto de equilíbrio que qualquer professor com bom senso sabe encontrar.

Mas gosto de “entrar a matar” na primeira aula. “Entrar a matar” significa aqui começar logo por mostrar como se discute um problema, ainda que de modo muito prematuro já que os alunos não estão, nesta altura, munidos das ferramentas nem da informação para pensar filosoficamente. Ocorreu-me fazer logo a distinção entre problemas filosóficos e não filosóficos. Peguei num problema da ética aplicada como exemplo, o do aborto. Perguntei aos alunos se lhes parecia certo ou errado uma mulher grávida recorrer ao aborto para interromper uma gravidez. Uma aluna respondeu de imediato que era errado. Questionei a razão que a leva a pensar tal coisa? Respondeu que se está a matar um ser humano. Estamos já no centro do problema, mesmo que com pouquíssima informação para a saber pensar. Ok, próximo passo, definir conceitos. Perguntei à turma como é que se define um ser humano. Entre algumas respostas, surgiu a mais habitual: “é um ser que raciocina”. De imediato perguntei se um feto humano raciocina? Gerou-se o impasse: os alunos estavam neste momento à procura de uma resposta para a minha questão, numa palavra, os jovens de 14 e 15 anos estavam a pensar pela sua cabeça. Meia hora da primeira aula foi passada nesta discussão. Claro que ainda há um trabalho prévio a fazer que iniciarei já amanhã, na segunda aula. Perderei também algum tempo – não muito – para ajudar os alunos a orientar o seu estudo em casa. Mas desta meia hora retiro uma conclusão: os alunos do ensino básico estão também preparados para aprender a filosofar. E há uma outra conclusão também a retirar daqui: não existe razão alguma para pensar que: 1) a filosofia não é atractiva para os estudantes; 2) a disciplina é difícil. Nenhum aluno desta turma achou muito complicado participar numa discussão racional. Alguns alunos provavelmente levaram para casa o pensamento de que têm de rever as suas posições face a um determinado problema. Não interessa: cada um colocará as questões necessárias exigentes para compreender o problema. E não me posso queixar que os alunos tenham achado a filosofia uma seca, pois sei que não é essa a sua opinião.

Por que não conhecemos a dimensão do universo?

planetas Reedito aqui um texto meu publicado no De Rerum Natura, em Fevereiro de 2008.

O post do Desidério "A Nossa Dimensão", chamou-me a atenção para um aspecto relacionado com o ensino em geral e com as ciências em particular.
O que sei de ciência é muito pouco e, em grande parte, é saber proveniente dos livros de introdução às várias áreas da ciência — desde a química à física, biologia, etc. — que vou lendo. Sem esses livros o meu conhecimento seria muito menor e isto porque já no meu tempo de secundário a escola que tive não me forneceu uma base sólida em matéria de ciência.

LER TEXTO INTEGRAL.(clicar)

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Área de Integração

Sobre a disciplina de Área de Integraçãoi reproduzo aqui um texto publicado originalmente no CEF.



Com a introdução do sub-sistema de Ensino Profissional na oferta formativa da Escola Secundária XXXXX e verificando-se a exclusão da disciplina de Filosofia da componente de Formação Geral, considera o Grupo 10º B que:
1. A disciplina de Área de Integração ocupa o lugar da Filosofia na Formação Geral. Assim sendo, o lugar natural da nova disciplina será o Grupo 10º B;
2. De acordo com o Programa oficial da disciplina, a Área de Integração procura favorecer “simultaneamente a aquisição de saberes oriundos das ciências sociais e da reflexão filosófica”, comprovando a relevância da Filosofia para a sua leccionação;
3. Sendo a Filosofia, ela própria, um espaço de reconhecida interdisciplinaridade, ressalvamos o facto de o próprio Programa salientar que “com este programa pretende-se, essencialmente, desenvolver a capacidade de integrar conhecimentos de diferentes áreas disciplinares, aproximar estes conhecimentos de experiências de vida dos alunos e aplicá-los a uma melhor compreensão e acção sobre o mundo contemporâneo”;
4. Salientamos ainda o facto de a bibliografia de referência ser constituída, em grande parte, por autores oriundos da Filosofia, tais como Fernando Gil, António Damásio, Edgar Morin, Fernando Savater, Simon Blackburn, Jean Piaget, Platão, Olivier Reboul, Paul Watzlawick, Ignacio Ramonet, António Zilhão, Alain Renaut, Niccoló Machiavelli, Carl Sagan, Marguerite Yourcenar, Boaventura de Sousa Santos, Gaston Bachelard, Jean Bronowsky, Karl Popper, Jean-Jacques Rousseau, Jean-Paul Sartre, André Breton, Luc Ferry e Sófocles
5. Cerca de dois terços do programa da referida disciplina são coincidentes com o programa oficial dos 10º e 11º anos da Filosofia. Também por esse motivo a nova disciplina é reclamada pelo Grupo 10º B;
6. Os sub-temas de Área de Integração que não coincidem com o programa de Filosofia coincidem, no entanto, com a formação de base dos professores deste Grupo bem como as disciplinas usualmente leccionadas pelos seus professores, tais como a Psicossociologia, a Sociologia, a Antropologia, a Ciência Política e a Psicologia;


Consequentemente, os Professores do Grupo 10º B reclamam a respectiva atribuição da disciplina de Área de Integração

Finalmente, reproduzo aqui todos os temas do programa para verificar quantas unidades programáticas tem, por exemplo, a ver com as competências com o grupo de Geografia (A vermelho as unidades leccionáveis pela Geografia. A azul, as unidades de competência da filosofia. A verde as leccionáveis pelas Relações Internacionais, preferencialmente, ou então a zona mais híbrida)

Área I – A Pessoa
Unidade Temática 1 – O SUJEITO LÓGICO-PSICOLÓGICO
Tema - problema 1.1 – A construção do conhecimento ou o fogo de Prometeu
Tema - problema 1.2 – Pessoa e cultura
Tema - problema 1.3 – A comunicação e a construção do indivíduo
Unidade Temática 2 – O SUJEITO HISTÓRICO-SOCIAL
Tema - problema 2.1 – Estrutura familiar e dinâmica social
Tema - problema 2.2 – A construção do social
Tema - problema 2.3 – A construção da democracia
Unidade Temática 3 – O SUJEITO BIO-ECOLÓGICO
Tema - problema 3.1 – O Homem e a Terra
Tema - problema 3.2 – Filhos do Sol
Tema - problema 3.3 – Homem-Natureza: uma relação sustentável?
Área II – A Sociedade
Unidade Temática 4 – A REGIÃO, ESPAÇO VIVIDO
Tema - problema 4.1 – A identidade regional
Tema - problema 4.2 – A região e o espaço nacional
Tema - problema 4.3 – Desequilíbrios regionais
Unidade Temática 5 – UMA CASA COMUM: A EUROPA
Tema - problema 5.1 – A integração no espaço europeu
Tema - problema 5.2 – A cidadania europeia
Tema - problema 5.3 – A cooperação transfronteiriça
Unidade Temática 6 – O MUNDO DO TRABALHO
Tema - problema 6.1 – O trabalho, a sua evolução e estatuto no Ocidente
Tema - problema 6.2 – O desenvolvimento de novas atitudes no trabalho e no emprego: o empreendedorismo
Tema - problema 6.3 – As organizações do trabalho
Área III – O Mundo
Unidade Temática 7 – A GLOBALIZAÇÃO DAS ALDEIAS
Tema - problema 7.1 – Cultura Global ou Globalização das Culturas?
Tema - problema 7.2 – Um desafio global: o desenvolvimento sustentável
Tema - problema 7.3 – O papel das organizações internacionais
Unidade Temática 8 – A INTERNACIONALIZAÇÃO DA ECONOMIA, DO CONHECIMENTO E DA INFORMAÇÃO
Tema - problema 8.1 – Das Economias-mundo à Economia Global
Tema - problema 8.2 – Da multiplicidade dos saberes à Ciência como construção racional do real
Tema - problema 8.3 – De Alexandria à era digital: a difusão do conhecimento através dos seus suportes
Unidade Temática 9 – A DESCOBERTA DA CRÍTICA: O UNIVERSO DOS VALORES
Tema - problema 9.1 – Os fins e os meios: que Ética para a vida humana?
Tema - problema 9.2 – A formação da sensibilidade cultural e a transfiguração da experiência: a Estética
Tema - problema 9.3 – A experiência religiosa como afirmação do espaço espiritual no mundo

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Mentiras e insultos

Discutir O que é moralmente menos aceitável: mentir cordialmente a uma pessoa, ou insultar honestamente?

Gostaria de discutir com outros leitores este problema.

domingo, 20 de setembro de 2009

Guia essencial - Filosofia

9789895507207_1252604296[10] Ainda sobrou algum tempo da noite de ontem para me dedicar ao Guia Essencial de Filosofia, do Stephen Law e publicado este mês entre nós pela Civilização Editora. O livro é bonito e muito bem feito. Está dividido entre alguma história da filosofia, as grandes áreas da filosofia e as ferramentas específicas da filosofia. Consegue ser melhor que muitos manuais do secundário, pese embora me pareça que não pudesse funcionar como manual (não esquecer que Law já organizou manuais escolares). Não conheço a edição original, mas a portuguesa tem um defeito que é a letra demasiado pequenina o que cansa a leitura. Mas o livro funciona como um pequenino, mas bem feito, motor de busca para a filosofia e é especialmente recomendado para quem, em 300 páginas, pretender ter na biblioteca um livro que diga algo com rigor sobre um saber que possui já alguns milénios de existência. Dentro das introduções (bem, este é mais um guia) ainda nenhum outro livro conseguiu destronar o Elementos Básicos de Filosofia de Nigel Warburton (Gradiva). Neste momento estamos numa posição confortável no mercado português no que respeita a pequenas e boas introduções à filosofia. Para além da de Warburton e esta de Law, temos ainda a de Raymond Martin e Daniel Kolak, Sabedoria sem respostas, a de Thomas Nagel, que quer dizer tudo isto?, a de Simon Blackburne, Pense e a recente de James Rachels, Problemas da Filosofia, todas, à excepção da de Martin/Kolak, publicadas na Filosofia Aberta da Gradiva. Estes livros são particularmente úteis para a divulgação correcta da filosofia.

sábado, 19 de setembro de 2009

Bem vistas as coisas

Ser_Humano E pronto. Passei o dia com a Psicologia B. Este ano isto vai andar assim, a deambular pela filosofia e por outras disciplinas que são pertença do grupo. Não tenho o vigor para analisar manuais de psicologia como tenho para a filosofia (pelo menos não estou tão à vontade), mas ainda assim, o manual adoptado na minha escola (Ser Humano, Porto Editora) parece-me estar muito certinho. É verdade que tem um forte pendor histórico, o que me aborrece um pouco (e será que não aborrece os alunos?), mas também é verdade que antes do manual li integralmente o programa da disciplina e ele aponta para esse caminho. Mas a avaliação que aqui faço é outra. Para um programa de 3 blocos semanais, e com (vá lá, ao menos isso) uma gestão de bolsa de tempos para o professor acima do normal, o manual está muito bem apetrechado de ferramentas e sugestões de trabalho. Um pormenor interessante: tem até um bom lote de sugestões para a primeira aula, tendo em atenção que em regra os alunos não levam o manual para a primeira aula. As sugestões na barra lateral, para o professor, são efectivamente úteis direccionando para outras páginas, para o livro do aluno, para o cd rom do aluno e DVD do professor. Sinceramente não tenho maturidade suficiente com a disciplina para fazer avaliações de fundo, mas as impressões causadas são pelo menos boas. Posto isto, acho que é horinha de ler um pouco de filosofia. A opção em cima da mesa recai sobre algo levezinho como o Guia de Filosofia do Stephen Law ou o mais intenso, Viver para quê?, colectânea de textos sobre o sentido da existência organizados por Desidério Murcho. Já se vê!

Ainda a Psicologia B

Na primeira unidade, a genética, li que o ADN é uma substância química constituída por quatro substâncias químicas: a adenina, a timina, a citosina e a guamina. Ok, ensino isto aos alunos. E depois o que é que fazemos com este conhecimento? O manual que estou a seguir (Ser Humano, Porto Editora) está cheio destas definições. Elas são para dar aos alunos ou para que estes compreendam melhor a relevância da genética para a psicologia? E se o segundo caso for o verdadeiro – e parece que é segundo o programa – para que serve então neste nível perder tanto tempo com definições inúteis em termos de aprendizagem da disciplina? O que pensam os colegas que ensinam psicologia?

Programas próximos da realidade

6 O programa de Psicologia B, 12º ano, aponta – e bem no meu entender – uma permanente busca e pesquisa do estudante para construção do portfólio e mapas conceptuais. São 6 horas semanais reservados à disciplina. Para este tipo de trabalho prático, obviamente são consideradas algumas condições essenciais à sua boa consecução. A sugestão de trabalho vem na página 15 do programa, como a seguir sublinho. Eu não vou contar com as condições apontadas, pelo que o trabalho prático se reduzirá ao manual, eventualmente aos pc`s portáteis do e-escolas, uma sala de aula com um quadro e giz. Quantos colegas pelo país fora conseguem as condições anotadas no programa?

Para que as sugestões metodológicas aqui propostas sejam facilitadas, convém que a escola possua

uma sala de Psicologia, própria ou partilhada com outra disciplina; o importante é haver um espaço onde

os materiais a serem consultados e investigados pelos alunos estejam organizados. Em aulas de pesquisa, ganha-se o tempo de ir à biblioteca buscar os materiais e evita-se que professor e alunos «carreguem» permanentemente com eles. Esta sala deveria, idealmente, possuir uma aparelhagem de som, um televisor e um vídeo, bem como um computador ligado à Internet. Este facto permitiria, dentro da mesma aula, diversificar as actividades dos alunos. Do mesmo modo, a sala deverá contemplar espaços de arrumação para as pastas de portfolio, para arrumação de cartazes e dos materiais necessários à sua construção. A sala poderá estar espacialmente organizada de modo a facilitar e a estimular permanentemente a comunicação em todas as direcções e o trabalho em equipa.

Programa de Psicologia B, p.15

Ensino profissional e CEFs, a verdade!

Idiocracy_PosterB Hoje em dia está na moda no sistema educativo português os cursos CEF (de educação e formação), também conhecidos por cursos profissionais. Não sei se há muitos leitores deste blog que sejam engenheiros, médicos ou gestores. Mas esta minha pergunta é-lhes dirigida: metiam os vossos filhos a estudar nestes cursos? Por quê? Recordo no ano passado estar à conversa com um director de cursos profissionais e quando este elogiava o ensino profissional, interrompi-o subitamente com a pergunta “colocavas os teus filhos a estudar no profissional?”. Após um pequenino momento de silêncio a resposta foi que não, já que desejava que os seus filhos seguissem a universidade. Ripostei que mesmo com o profissional podiam candidatar-se à universidade e até com a probabilidade de o fazer com melhores classificações. A verdade velada é que este director de cursos profissionais não quer os filhos neste tipo de cursos pois sabe da sua falta de qualidade científica em relação aos cursos de formação geral do ensino regular. Quando faço estas observações em regra as pessoas pensam que sou contra a existência de ensino profissional. Mas não sou. O que defendo é que os cursos profissionais não têm de ser diminuídos de formação científica em relação aos cursos do regular. Quem destrói o ensino profissional não sou eu, mas o próprio sistema de ensino que transforma o profissional num tipo de ensino vazio de conteúdos academicamente relevantes e indiscutivelmente importantes para a formação de qualquer pessoa. e como assim é, as pessoas sabem que o profissional é dirigido aos mais aleijadinhos, aos filhos dos intelectualmente incapacitados (julga a ideologia reinante) ou pouco ambiciosos na vida. Ora isto é tudo aquilo que um sistema de ensino deveria evitar pressupor, a de que há seres humanos que não precisam de saber pitada de ciência, de filosofia, de artes, música, etc. para serem felizes. Isto sim é um sistema de ensino elitista no fraco sentido, e marcadamente ideológico contribuindo de forma significativa para a reprodução do estatuto social das classes mais favorecidas. É tudo aquilo que não deve ser um sistema de ensino numa sociedade livre. Ensino profissional sim, mas com rigor e excelência.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Lógica aristotélica ou proposicional? Qual ensinar?

Um colega recentemente colocou uma questão interessante para planificar o 11º ano. O grupo de filosofia decidiu leccionar a lógica aristotélica, ao passo que o colega deseja ensinar a proposicional. Perguntou-me se eu achava bem que leccionasse as duas. Não, não me parece correcto ensinar as duas versões da lógica, a não ser que por interesse histórico se aborde a versão inicial de Aristóteles. Mas isso é coisa que se faz nuns 10 minutos de uma aula. É que, a dizer a verdade, qual o interesse de leccionar a lógica aristotélica? (ou aquilo que dela faz os manuais) Basta colocar uma questão aos colegas que leccionam a aristotélica: para que serve o que os alunos aprenderam para aplicar às restantes unidades do programa? Na verdade não há aplicação alguma da lógica aristotélica ao resto do programa, não se faz nada com ela. Pelo contrário, com a lógica proposicional ensinada de um modo simples, podemos passar o resto do ano a aplicá-la aos argumentos. Além do mais a lógica proposicional é mais fácil, cria menos ambiguidades de compreensão nos alunos e os alunos gostam muito mais (também já ensinei a aristotélica para saber do que falo). Mesmo para quem nunca ensinou a proposicional, um esforço inicial representa ganhos óbvios a curto prazo e um gozo muito maior ao ensinar filosofia. Basta pensar em pequenos exemplos para perceber o nível de aplicação da lógica proposicional: sem a saber como vai o aluno perceber quando encontrar mais tarde um argumento dedutivamente válido? Só o sabe se souber também colocar esse argumento na forma silogística. Só que essa é tarefa de especialistas. Até por aqui se vê logo que a ideia que a lógica aristotélica é mais fácil para os alunos é falsa. Senão tentem lá colocar os argumentos dos textos filosóficos na forma silogística. O aluno não chegará sequer a entender que um argumento pode parecer persuasivo mas dedutivamente inválido. Se o aluno não conhece estes aspectos da argumentação, como somos capazes de lhe dizer que a filosofia é a busca da verdade? Que busca fará o aluno se não conhece sequer as ferramentas mais básicas para essa busca? Sem ensinar a lógica proposicional, ainda que de uma forma elementar (bem, ela é em si elementar), o estudante não reúne qualquer capacidade para compreender quando está perante um bom e um mau argumento. Só por interpretação mágico-místico-cartomante é que lá chegará. E é bom que nós, professores de filosofia, percebamos estes aspectos de ensino da nossa disciplina.

Mas há que ter em atenção um outro aspecto. Qualquer uma das lógicas é apresentada na maioria dos manuais com erros. Claro que esses erros são menos visíveis na aristotélica, pois ela é tão limitadinha que facilmente cria confusões e pensamos que estamos a ler coisas certas quando estão erradas. É uma ferramenta incompleta, ponto. O melhor mesmo é recorrer aos bons manuais (tenho imensas sugestões neste sentido no blog) e segui-los, mesmo com o prejuízo de não usar muito o manual que está adoptado. Também vi alguns autores de manuais ensaiarem um híbrido entre lógica aristotélica e proposicional e saiu borrada, pelo que não é aconselhável seguir por aí.

Mas a opção de leccionação é do professor. Até este ano na minha escola leccionei 11º ano e sempre leccionei a proposicional, ao passo que os meus colegas leccionavam a aristotélica. Só é possível ensinar a lógica aristotélica de duas formas:

1) Ou se ensina história da filosofia e história da filosofia é história e não filosofia.

2) Ou se ensina a lógica aristotélica como se podia ensinar o tio Patinhas, de forma isolada, sem qualquer correspondência com o programa.

 

Excluo aqui alguns colegas que possuem uma sólida formação na lógica de Aristóteles e que conseguem fazer pequenas maravilhas com ela, mas esses colegas são em número reduzido, certamente. Não saímos dos cursos de filosofia especialistas em lógica e essa é mais uma boa razão para ensinar a proposicional, a bem do ensino de filosofia de qualidade. Se pegarmos no programa de filosofia tendo em atenção alguns pequenos aspectos, começamos logo a pedir que o programa seja reformado. E esta é a piada de muito do ensino da filosofia: pedimos aos alunos, muitas vezes, para fazer o que nós próprios não andamos estes anos todos a fazer com a nossa disciplina: a pensá-la criticamente.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Bem vindo à barafunda

burocracia Ora bem, o ano lectivo começa por estas bandas na segunda feira. Soube hoje ao fim da manhã o meu horário. Ao fim de 13 anos a ensinar soube que vou ser professor de Cidadania e Mundo Actual a uma turma CEF do 3º ciclo (ou 2º, nem sei bem), vou ensinar Psicologia B e, imagine-se, nem contava, Filosofia a uma turma do 10º. Continuo delegado de disciplina e acumulo funções de director de turma, e tenho no horário horas infinitas para reuniões em regra bastante produtivas em termos de ensino.

Bem, mas não me posso alongar no post, já que tenho de preparar aulas de 3 níveis de ensino, mais uma reunião de grupo e uma outra de Director de Turma (incluindo recortar fotografias e colar nos cartões dos alunos). Só me está aqui a dar comichão uma perguntinha que gostaria que os colegas leitores me ajudassem a responder: é a isto que se chama qualidade do ensino? É que não estou a topar onde é que está a qualidade do ensino nesta coisa toda? Chamar-lhe-ia antes, sei lá, um ensino sem rei nem rock. Mas certamente tenho aqui a dar uma palavra de profundo agradecimento a toda a impostura política que anda em volta do ensino. E tenho uma certeza: este blog já anda pobrezito, mas vai ficar ainda mais pobrezito ao longo deste ano. Raios partam.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Oficinas de Filosofia Prática e Pensamento Crítico

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Aplicação de técnicas de Pensamento Crítico a discussões filosóficas reais

Dias 13, 14, 15, 16, 20, 21, 22 e 23 de Outubro

Local - Reitoria da Universidade do Porto

Apresentação das Oficinas

A Filosofia Prática e o Pensamento Crítico são duas áreas distintas mas complementares que têm como objectivo comum a prática e o aperfeiçoamento das nossas capacidades cognitivas e argumentativas.
O Pensamento Crítico é uma área transversal a todas as disciplinas (Português, História, Ciências Naturais, etc.) onde se cultiva a análise e avaliação cuidada de raciocínios e argumentos.
Na Filosofia Prática a ênfase é colocada na procura pessoal, activa e crítica de respostas aos problemas filosóficos.
Nestas Oficinas de Filosofia Prática e Pensamento Crítico serão partilhadas uma série de técnicas, conceitos e instrumentos cognitivos, lógicos e argumentativos da área do Pensamento Crítico, aplicando-os a discussões filosóficas (Filosofia Prática) sobre diversos temas filosóficos: verdade, conhecimento, bem e mal, arte, etc.*
O prazer do pensamento filosófico
Da mesma forma que um desportista, um filósofo tirará maior prazer e proveito enquanto praticante que enquanto observador. Nesse sentido, estas Oficinas de Filosofia Prática e Pensamento Crítico têm como objectivo principal fazer filosofia e não simplesmente falar de filosofia.
Estas Oficinas pretendem proporcionar o prazer do pensamento filosófico aos seus participantes que, com essa prática filosófica exercitarão também outras virtudes como a tolerância, o saber ouvir(-se), o espírito crítico e a argumentação.
Aventure-se a pensar connosco!

INFORMAÇÕES GERAIS 
Horário: 18h30 - 21h30
Preço: 90€ UP | 100€ fora UP
Inscrições até 20 de Setembro, limitadas a 30 participantes -

Ana Martins: anamartins@reit.up.pt ou Ruben Rodrigues: rrodrigues@reit.up.pt;

Tlf.  220408193

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Com tantos livros de filosofia agora deu-me para isto:

 9789722342186 Cheguei tarde ao mundo dos livros. Tive aquela sensação de ser o miúdo mais novo do bairro. O meu primeiro livro, As cinzas de Angela, foi publicado em 1996, quando eu tinha sessenta e seis anos, e o segundo, Esta É a Minha Terra, em 1999, quando tinha sessenta e nove anos. Com essa idade, é quase de admirar conseguir pegar na caneta. Alguns dos meus novos amigos (amizades recentes que ficaram a dever-se à minha ascensão à lista dos best sellers) tinham publicado livros aos vinte anos. Crianças…

Então, porque é que demorei tanto tempo?

Era professor – foi por isso que demorei tanto. Não na universidade, onde se tem todo o tempo do mundo para escrever e para outras distracções, mas em quatro liceus da cidade de Nova Iorque.

Frank McCourt, O professor, Presença, 2009, Trad. Maria do Carmo Figueira

Terei lido bem?

Ainda sobre o livro dos posts anteriores. Terei mesmo lido bem? Imaginemos que o professor, mesmo no seu primeiro ano de trabalho, adoece e não pode ir à escola durante uns dias. O que tem de fazer? Antes da resposta vamos lá ver o que um professor em Portugal tem de fazer. Se está doente vai às urgências do Hospital. Entretanto se tiver de faltar ao trabalho, após a consulta no hospital tem de se dirigir ao Centro de Saúde para obter um atestado. Caso contrário vai a uma clínica privada e paga logo a consulta com direito a atestado. Mas, segundo o nosso livrinho, escrito para leitores ingleses, o que tem de fazer o professor? Tem, simplesmente de telefonar para a escola e informar sobre a sua situação e os dias que se vai ausentar. Começa a confirmar-se as minhas suspeitas: no que toca ao essencial as diferenças aparecem. Será que temos um défice de cidadania? Será que se o sistema fosse assim em Portugal choviam os telefonemas para as escolas a anunciar professores doentes? Provavelmente tal não sucederia se estivesse em causa assegurar o emprego e o absentismo fosse sistemático. O ridículo no nosso caso é a avalanche de atestados falsos. É no que dá o excesso de formalismo e formalidades.

Como sobreviver no primeiro ano de ensino?

publicityphoto_002 Já avancei o primeiro capítulo do livro de Sue Cowley que menciono dois posts abaixo. Não é um livro técnico e a autora adverte isso logo no prefácio. Mas é bom ler estes livros para percebermos em que é que andamos próximos ou distantes de outros povos e culturas. Em termos de organização nas escolas e do trabalho docente, há muito de comum com a realidade portuguesa. De destacar, não vi nenhuma referência a concursos de professores, sendo que a única referência presente à entrada do professor na escola é feita por entrevista do director. Mas aparece as referências aos departamentos, ao delegado de departamento e ainda a outros elementos que nos são comuns. Dado que o livro se destina àqueles que pela primeira vez ingressam na carreira, há uma referencia curiosa a alguma instabilidade profissional. A autora não lhe chama instabilidade, mas refere que o professor nos primeiros anos pode andar a saltar de escola em escola e tem de lidar com as diferentes formas organizativas de cada escola.

Vou avançando a ritmo lento na leitura, mas já estou a antecipar o filme: no essencial de todo o processo educativo é que vamos encontrar diferenças significativas. Vamos ver.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Uma obra de arte



Sem dúvida alguma que alguns cineastas nos fazem pensar e crer que o cinema é uma das maiores artes de sempre como criação humana. Como classificar este filme de Maya Daren? Qual das teorias filosóficas da definição da arte mais se aproxima de uma obra como esta?

Nem de propósito!

Já o tinha encomendado há umas duas semanas, mas chegou somente hoje, no dia oficial de abertura do novo ano lectivo. Já dou aulas há mais de uma década, pelo que o título do livro não me é inteiramente dirigido. Mas parece possuir (ainda não li o livro) um bom lote de sugestões que serve para os respectivos reparos e upgrades necessários à profissão e que a formação de professores em regra não consegue oferecer. E já que falo em formação, aproveito o post para comentar brevemente a última formação que fiz, decorria o ano transacto. Essa formação foi dada por um professor universitário que reunia os piores tiques que conheci há anos na universidade. Entre muitos outros, o tique de que não atribuía nota de 20 aos seus alunos. Quando o interpelei por que razão não o fazia, respondeu o habitual: “20 é para alguém melhor que eu”. Chiça, eu não pediria tanto para mim!!! Fiz saber ao mestre que isso não é uma boa razão, mas um preconceito académico. Levei com um, “bem mas vamos avançar que isto não é assunto da formação”. Pois não era. Mas então porque o referiu? Porque, penso, isto está tão enraizado na cultura académica que regra geral nunca há objecções. Outro dos tiques evidentes foi a gabarolice de respeito pelos prazos, de exterminador implacável na hora da entrega das notas e por aí adiante. Desconfiei muito e o tempo deu-me razão. Fiz a formação já no passado ano e ainda aguardo pela classificação. Curiosamente, por comparação, quando fiz a formação com o colega Desidério Murcho, não ouvi qualquer gabarolice que era o campeão da organização e método, mas as notas vieram uma semana após a formação e com os trabalhos entregues completamente corrigidos. Este episódio faz-me crer que este livro que hoje recebi talvez faça falta a muita boa gente que dá aulas há uns anos.

Já agora, vale a pena ler este texto da autoria de Aires Almeida.

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Oscar Brenifier

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Arranca o ano lectivo

Escola Arranca hoje oficialmente (na Madeira arranca uma semana mais tarde) o ano lectivo 2009/10. A palavra a dar neste momento é de felicidades a toda a comunidade escolar. Mas não posso esquecer algumas dificuldades (parte delas expostas na minha série de pequenos artigos Como Ensino Filosofia?) com que professores se deparam logo à partida. Uma delas diz respeito aos horários e o caso do grupo de filosofia não é isolado. Numa boa parte dos casos as escolas entregam os horários aos professores com apenas alguns dias de antecedência. À excepção dos professores de quadro de escola que podem escolher níveis de ensino e parte dos horários, todos os outros, mesmo os de quadro de zona pedagógica, ficam quase até ao dia de início do ano sem ter ideia do que vão ensinar. Assim, um professor, contratado ou de QZP pode saber 3 dias antes do arranque que vai ensinar Cidadania e Mundo Actual ou até Psicologia e pode não ter leccionado essas disciplinas em anos anteriores. Significa isto que o professor tem 3 dias para se inteirar do programa da disciplina (no caso dos profissionais numa boa parte dos casos é o professor quem decide sobre os conteúdos e tem 3 dias para elaborar um programa de raiz), preparar a avaliação, etc. O resultado disto é um início de ano atrapalhado sem que o professor tenha muito claro o que vai ensinar. O caso dos professores contratados ainda me parece mais grave, já que podem andar um ano inteiro a preparar materiais e um programa que no ano seguinte nem sequer dão continuidade. Este aspecto, apesar de me parecer central na organização do ano lectivo, não foi, com efeito, alterado pela maioria das escolas. Mas é um problema que afecta grandemente a qualidade do ensino e das aulas. Todos os anos conheço professores que ainda não têm sequer o manual da disciplina já lá vai o ano com 2 ou 3 semanas de avanço.

Este é um problema que devia ser corrigido, a bem de professores, alunos e da qualidade do ensino em geral.

domingo, 13 de setembro de 2009

Sentido de urgência aplicado ao sistema de ensino.

untitled105 Recomendado pela minha esposa, que é gestora, peguei no livro Sentido de Urgência (Actual Editora, 2009) de John P. Kotter, um prestigiado especialista em liderança e professor do Harvard Business School. No livro o autor começa por explicar a diferença entre complacência e sentido de urgência dentro das organizações. A escola é também uma organização, no sentido técnico da gestão. A meio termo entre a complacência e o sentido de urgência temos, segundo o autor, o falso sentido de urgência. O falso sentido de urgência, grosso modo, é quando temos muita coisa para fazer dentro da organização, mas todo esse trabalho é produtivamente ilusório, já que não produz qualquer urgência dentro da organização, o que implicaria mudança. Este quadro parece-me assentar bem no que é hoje em dia a tarefa de um professor dentro das escolas portuguesas, isto é, vive-se um clima de falso sentido de urgência, com dezenas de tarefas improdutivas para executar, ao passo que se despreza o sentido de urgência, precisamente aquele que constituiria o motor de inovação do ensino. Ainda vou no segundo capítulo do livro, mas não consigo desprender-me de um paralelo que página a página vou fazendo com as escolas e o sistema de ensino. Vamos ver o que dizem os capítulos seguintes.

sábado, 12 de setembro de 2009

Onde é que Popper aparece na ciência?

262414 O Expresso de hoje traz na revista Única uma boa entrevista a Alexandre Quintanilha. Só para perceber o quanto Popper está presente nas mentes dos cientistas, deixo aqui estes pequeninos excertos:

Pode um cientista na área da biologia não acreditar na Teoria da Evolução das Espécies?

Darwin postulou uma hipótese, desde então temos feito tudo para ir à procura da evidência que seja a favor ou contra . Aliás, é mais importante ir à procura da evidência contra porque se a teoria for abaixo haverá outra ainda mais sofisticada.

Nem quando se confirma a hipótese?

(…) todos os grandes avanços na ciência são feitos quando as pessoas, depois de confirmarem a hipótese passam 50 anos a ver se a desaprovam.  As teorias mais robustas são as que resistiram a todas as tentativas de as contraprovar.

É destes que eu gosto

E pronto. Ainda nem o vi, mas conheço bem o autor, para além de algumas recensões. De certeza que entra para a minha lista de referências na ponta da língua, daquelas que estão sempre prontas a sair como recomendação para os que ainda mal entraram na filosofia. Falarei dele certamente mais vezes.

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Stephen Law, Filosofia, Col. Guias Essenciais, Civilização, 2009

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Será um bom princípio?


No final dos anos 60 e princípio dos anos 70 foram escritos diversos livros sobre a auto-estima das crianças. Esses livros tornaram-se a «bíblia» da educação das crianças. Os seus autores defendiam que as crianças só desenvolviam a sua auto-estima se os pais mostrassem respeito por elas. A forma de os pais mostrarem respeito pelos filhos era tratá-los como seus semelhantes. Quer isto dizer que os pais deveriam dar aos filhos o mesmo direito de estabelecer regras, tarefas, privilégios, e por aí adiante. Chegar a um acordo era a maneira prescrita para resolver todas e quaisquer diferenças de opinião. Quando o filho se portava mal, os pais deveriam apelar à sua inte1igência e sentido de responsabilidade, explicando a diferença entre o bem e o mal. Em caso algum deveriam castigar um filho por mau comportamento, pois o castigo violava a premissa fundamental da igualdade.

Estes mesmos autores defendiam também que a única família psicologicamente saudável era a família democrática . Segundo eles, na família democrática ninguém tinha mais poder que o outro. Defendiam a chamada «arte de ouvir activamente», que, essencialmente, proibia os pais de dizerem aos filhos o que deviam fazer. Em vez disso, deveriam ouvir imparcialmente o ponto de vista do filho, comunicar calmamente as suas opiniões e deixar que o filho assumisse a responsabilidade pelos seus próprios actos.

Por melhor que possa parecer, a família democrática era, é e sempre será uma ficção. Se isso o fizer sentir-se melhor pode fingir que tem uma família democrática, mas a pretensão está muito longe da realidade. A ilusão da democracia na chamada família democrática é criada e mantida com muitas palavras, debates de ideias, explicações e auscultações da opinião das crianças. Mas, se puser a retórica de parte e for ao fundo das coisas, descobrirá uma verdade incontestável: na chamada família democrática há sempre alguém que tem a última palavra. Este simples facto destrói toda e qualquer ilusão de democracia. Além disso, é melhor que esse alguém seja um adulto, ou então toda a família fica em apuros.

Caça ao tesouro no espaço

Digitalizar0001 Há uns tempos registei AQUI a publicação de um romance escrito para crianças, mas podendo ser lido por adultos, de Lucy & Stephen Hawking. Saiu este mês, pela Editorial Presença o seguimento desse romance. Já o tenho aí em lista de espera, já que gostei muito do primeiro volume e gosto particularmente deste tipo de livros de divulgação científica. Na filosofia temos algo muito parecido, os Philosohy Files de Stephen Law, que aguarda ainda tradução.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Moralidade e limpeza da escola

O leitor e colega Daniel enviou um link para um video que dá que pensar. Nele vemos jovens estudantes que após as aulas, limpam a escola e a sala de aulas. Para nós esta realidade é estranha, mas pensemos lá um pouco. Como pais investimos muito a ensinar os nossos filhos a arrumar e limpar aquilo que sujam e desarrumam. Mas fora de casa, esse hábito não é continuado e rapidamente os mais pequenos aprendem que podem sujar à vontade que há sempre quem limpe por eles. Será que o hábito dos japoneses é moralmente aceitável ou condenável? Será que se também na escola ensinarmos as crianças, desde pequeninas, a arrumar e limpar o que sujam não estamos a responsabilizá-los e a respeitar os outros? Fica o video.


Indispensáveis

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Para a reentré 2009-2010, é impensável não ter estas ferramentas de trabalho à mão.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

E já agora…

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Sempre apreciei ideias simples e com bom gosto. Esta t-shirt, em tamanhos para crianças e adultos pode ser adquirida a partir de AQUI.

Filosofia para crianças

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Pais avaliam escolas no i: Ensino está demasiado fácil

O ensino nas escolas está demasiado fácil e os últimos quatro anos acentuaram o problema. Para a maioria dos 45 pais ouvidos pelo i, os problemas pioraram com a crispação entre professores e Governo, que criou instabilidade nas escolas. E dão exemplos "O estatuto do aluno é um desastre e uma ofensa aos alunos cumpridores. Valores e atitudes como o trabalho, o mérito, a assiduidade, o comportamento, a aprendizagem, o conhecimento, foram postos em causa e de repente considerados antiquados e conservadores", diz Manuel Marques, economista nas Caldas da Rainha, pai de um aluno matriculado no 8º ano. "O estatuto do aluno privilegia o facilitismo e desresponsabiliza os alunos", acrescenta Maria José Viseu, presidente da Confederação Nacional Independente de Pais e Encarregados de Educação (CNIPE). "Esta norma de os alunos não poderem reprovar até ao 10º ano é um verdadeiro disparate. Desmotivador para alunos, pais e professores. O que sente um professor quando no 9º ano encontra um aluno que nem sabe conjugar os verbos?", questiona Maria Castelo Branco, 53 anos, mãe do Gonçalo, que vai frequentar o 10º ano. "A exigência académica é cada vez menor", remata Teresa dos Santos Paiva, mãe de um aluno do 10º ano e de duas filhas gémeas no 6º ano, que logo a seguir dispara contra um regime de faltas pouco rigoroso e que iliba os mais faltosos: "Os mais espertos olham para o regime de faltas como uma brincadeira. De que serve dizer-se que os alunos não podem faltar se sabem que estudam um pouco, fazem um teste de recuperação e já está, voltam a ficar sem faltas ou com elas todas justificadas?" LER O RESTO

 

 

Afinal parece que há mais pessoas quem pensam que uma boa reforma de ensino começa pela reforma curricular bem feita, isto é, dotar os programas de conteúdos claros, plausíveis e rigorosos, isto mesmo antes de qualquer estatuto do aluno ou reforma de corte nos vencimentos dos profissionais da educação. Recentemente quando defendi isto no blog SIMPLEX, Porfírio Silva acusou-me de ter a verdade na mão. Não estou certo se a acusação resultou do tom como o disse ou do que disse. Mas fico mais descansado de saber que há mais pessoas a partilhar da mesma ideia. É confortável, pelo menos.

Fazer filosofia é o mesmo que estrelar um ovo?

bolsa_ovo_estrelado Um dos argumentos mais frequentes para colocar a filosofia em causa é que, em filosofia, raramente a palavra conduz à acção. Trata-se de algo muito abstracto sem consequências práticas. Esta tese não é válida para qualquer saber. Mas supondo que seria uma tese assente em premissas verdadeiras, em que é que a filosofia seria diferente da política quando nela observamos que a palavra não conduz à acção? Da gestão quando observamos buracos financeiros em inúmeras obras feitas? Da economia quando as previsões falhadas se acumulam às centenas? Do Direito quando a justiça mal funciona? Da ciência quando em 100 hipóteses somente uma estará correcta? Afinal quando se diz que a filosofia é aborrecida pois não tem nada a ver com a realidade concreta das coisas, está provavelmente a dizer-se uma trivialidade. A mim parece-me que defender que a filosofia é pouco prática, resulta de preconceito. Bem, mas é bom admitir que em filosofia não se estrelam ovos. Mas não se estrelam ovos em todas as actividades que não sejam realmente o episódio de estrelar um ovo.

domingo, 6 de setembro de 2009

Divulgação

Do cartaz, destaco a presença de Ernest Sosa.

 

cartaz

A escola das competências

A revista Notícias Magazine, do Diário de Notícias, edição de hoje, traz uma entrevista a João Costa, investigador e professor universitário em linguística. Nunca ouvi falar neste nome, mas é o convidado para falar em educação. Refere o suposto especialista desconhecido:

“Queremos uma escola onde os alunos apenas aprendam conteúdos enciclopédicas ou onde se faz educação e se desenvolvam competências?”

É claro que queremos uma escola onde os alunos aprendam que se estiverem demasiado tempo sentados na sanita de uma casa de banho pública depois de defecarem sem puxar o autoclismo, quem usa a seguir a casa de banho vai sentir-se incomodado com o cheiro. É claro que queremos uma escola onde os alunos aprendam a respeitar os outros. Mas a pergunta que deixo de imediato ao suposto especialista é: E como é que ele desenvolveu as suas competências sem os conteúdos “enciclopédicos”? O discurso do suposto especialista é o que hoje em dia reina na moda que reflecte o desprezo pelos conteúdos, pelo conhecimento. Claro que ninguém assume isto directamente. Mas se não desprezam os conteúdos por que razão estes especialistas cometem logo a falácia do falso dilema? Ou temos uma escola que ensino conteúdos, ou temos uma escola que só ensina competências. Ora bolas, será que estes especialistas não percebem de uma vez por todas que o problema não são os conteúdos mas a forma como os mesmos são expostos e ensinados? Será que estes especialistas não percebem que o que há que reformar é precisamente os programas que estão esvaziados de conteúdos? E será que estes especialistas não percebem que esse esvaziamento de conteúdos é que tem sido responsável pela desmotivação da escola? O próprio mercado de trabalho nem sempre valoriza quem tem habilitações académicas pois não conseguem sequer distinguir entre quem tem o 12º ano e o 9º ano, já que parece que ao nível de conhecimentos a pessoa que tem o 12º ano parece numa grande parte dos casos estar ao mesmo nível da que tem o 9º.

O especialista João Costa muitas vezes ao longo da entrevista dá passos mais brandos, mas neste momento seria importante que um especialista desse mais importância e relevo nas suas declarações públicas ao papel decisivo que um ensino com valor e rigor tem no desenvolvimento de competências. Querer ensinar um aluno a ser carpinteiro sem saber matemática é realmente tão vazio como lhe atirar para cima a matemática sem lhe desenvolver capacidades críticas de raciocínio. Mas este discurso é só o resultado da educação romântica . A qualidade do ensino e o desenvolvimento de competências não se faz à margem dos conteúdos “enciclopédicos”. A ciência e o conhecimento em geral são património de todos e não faz qualquer sentido que a escola parta do princípio que há uma larga franja da sua população que não está habilitada para conhecer o seu património. Essa sim é uma escola que falha. Mas por cá chama-se a essa escola, a Escola das Oportunidades.

Russell no universo da BD


É curioso saber do sucesso popular de uma figura como Bertrand Russell, agora presente nas histórias de quadradinhos, BD. É talvez uma boa forma de fazer o público da BD entrar no pensamento de Russell e do mundo da filosofia. Ver mais AQUI. A obra tem um títule engraçado, de sintese. Chama-se Logicomix.