sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Apelo aos estudantes

No site da Gradiva, Guilherme Valente, o editor faz um apelo aos estudantes universitários que aqui reproduzo. É importante ter consciência que para reforçar o mercado de edições em Portugal é preciso fazer um esforço para investir nos livros. Somente desse modo é possível pagar aos tradutores e todo o trabalho que envolve a edição.
APELO AOS ESTUDANTES
Por favor, não fotocopiem os livros.
Se o fizerem estarão a pôr em risco seriamente a continuidade da edição das grandes obras que precisam de ler para realizarem cursos universitários dignos desse nome.
Além disso devem ler as obras na íntegra. Só assim descobrirão o prazer do conhecimento. Depois de ler um grande livro, quem não sentirá que ficou diferente, muito mais rico intelectualmente, um cidadão mais crítico, mais livre? 

SE NÃO TIVEREM DISPONÍVEL O DINHEIRO NECESSÁRIO PARA PAGAR UMA OBRA QUE PRECISEM DE LER OU QUE DESEJEM TER, DIRIJAM-SE A MIM DIRECTAMENTE, PARA LHES FAZERMOS O DESCONTO QUE PRATICAMOS PARA OS QUADROS DA GRADIVA (desde que essa obra não esteja abrangida pelo período determinado na Lei do Preço Fixo)

 
O editor
Guilherme Valente
gvalente@gradiva.mail.pt


quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Ainda sobre a tragédia da ilha da Madeira



O problema da ilha da Madeira levanta algumas questões pertinentes. Continuo convencido que o factor humano é mínimo nesta tragédia que afectou meios rurais onde a intervenção humana é mínima. A questão talvez seja a de saber se um outro ordenamento do território na zona urbana do Funchal poderia ter minimizado danos. É perfeitamente possível que sim. O problema é que não podemos pensar o problema somente com os dados da geografia ou da meteorologia, mas temos também de o pensar à luz da ética, da economia e da própria economia. O problema do ordenamento do território é um problema que cresce com o desenvolvimento económico da ilha, como uma série de outros fenómenos. Na minha escola organizamos, há dois anos, as Jornadas da Filosofia, onde se debateram as perspectivas éticas em torno do progresso. O filósofo Peter Singer tem bibliografia adequada publicada em português, principalmente o Ética Prática e o Um só Mundo, ambos publicados pela Gradiva.
Finalmente agradeço ao colega geógrafo Vitório, que me indicou o vídeo que anexo neste post e com quem mantenho vivas e interessantes pontos de vista sobre este e outros problemas.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

O meu testemunho da tragédia na ilha da Madeira




Tenho ouvido e lido várias vezes argumentos que procuram mostrar, sem justificação suficiente no entanto, que existiu uma grande culpa da intervenção humana e da falta de planeamento urbanístico na ilha da Madeira. Resido há quase 10 anos na ilha e recordo que desde sempre as ribeiras são uma questão política e social na Madeira. Embora me pareça que os argumentos carecem de muita apreciação mais técnica há com efeito um dado que presenciei empiricamente que me faz acreditar que a intervenção humana nada teve a ver com o que aconteceu na ilha. A água vem das altas montanhas da ilha. A ilha não está habitada no cume das montanhas e a grande totalidade da montanha da ilha da Madeira não tem sequer intervenção humana. É natureza pura e pertence ao parque natural da ilha onde não é possível sequer qualquer intervenção. Eu próprio já fiz alguns percursos na montanha sem que tenha visto qualquer vestígio de intervenção humana a não ser as veredas, que são  estreitíssimos caminhos de terra feitos à mão há alguns séculos já e que hoje em dia são alvo de caminhadas turísticas sempre com guias especializados.
O mais impressionante é que a água não chegou ao litoral da ilha somente seguindo os cursos das ribeiras, senão vejamos o caso que mais me impressionou. Na zona da Pena morreram várias pessoas, provavelmente, além da Ribeira Brava, a localidade onde mais pessoas perderam a vida. Faço essa estrada duas vezes por semana, pelo menos. Ora, não conheço qualquer ribeira junto dessa estrada. Ou seja, a água pura e simplesmente veio da serra por onde calhou e não procurando somente os cursos naturais das ribeiras.
Mas há mais dados. Por exemplo, segundo sei, o leito da ribeira na Ribeira Brava, praticamente não foi alterado e a Ribeira Brava é uma localidade relativamente pequena. A Ribeira Brava é ladeada por montanhas ficando num belo vale. Aliás, uma das paisagens mais belas que conheço da ilha da Madeira é a deste vale. Na Ribeira Brava não se coloca o problema do desordenamento urbanístico. Com efeito foi uma zona muito afectada. E isto para não falar do Curral das Freiras, uma aldeia com cerca de 4 mim habitantes. Mesmo sem qualquer efeito de desordenamento urbanístico, o Curral foi muito afectado.
Por outro lado, a ilha da Madeira praticamente não tem zonas planas. Já vivi em duas casas diferentes na ilha e recordo que tive alguma dificuldade em encontrar a casa que mais queria precisamente porque gosto de zonas planas e as poucas que existem são encostadas ao litoral e muito caras. Por outro lado, mesmo sem conhecimentos técnicos ou científicos, é de notar que nenhum prédio ruiu no Funchal, mesmo contra o argumento dos ambientalistas que juram que os prédios estão construídos sobre as ribeiras.
Creio que as imagens da TV não conseguem mostrar o que tenho presenciado aqui na ilha. Por todo o lado, com ou sem ribeiras, encontro rastro de destruição e ainda não me desloquei muito pela ilha. A zona antiga da cidade do Funchal chega a ter uns impressionantes 3 metros de atura de terra batida (a da serra) e pedregulhos, alguns de um tamanho impressionável ao olhar. Gostaria de saber qual a ribeira ou até rio do mundo que aguentaria tal avalanche? Grande parte das ribeiras foram devidamente canalizadas pelas autoridades regionais. Aliás, essa sempre tem sido uma preocupação enorme do governo regional, pelo que estou crente que se assim não fosse, ainda teria sido pior a catástrofe. E atenção que as ribeiras só estão canalizadas já na marginal da ilha. É certo que se a água vem da montanha, chega à marginal com uma velocidade impressionante, mas foi precisamente a canalização das ribeiras que condicionou a que muita da água não se espalhasse muito mais. Mas o impressionante, repito, é que a água não chegou ao Funchal somente pelas ribeiras, mas por todo o lado. Dá-me toda a impressão que a obra foi da natureza, pelo menos da natureza que ainda não conhecemos e dominamos cientificamente. Mas tenho dúvida que toda a ciência junta na ilha da Madeira não teria evitado a tragédia.
É já a segunda vez na vida que presencio tragédias com perdas humanas elevadas. A primeira foi a queda da ponte de Entre-os-Rios, Castelo de Paiva, a minha terra natal. Na altura fiquei convencido que a culpa era realmente da componente humana, da falta de conhecimento. As pessoas em geral sentiam insegurança com a ponte há mais de uma década. Eu próprio lá passei duas vezes algumas horas antes da queda e numa dessas vezes comentei o mau estado da ponte que poderia não resistir à força das águas do Douro. Aqui na Madeira a causa parece-me bem diferente.
Para poupar algumas reacções acho que devo dizer que me estou nas tintas para a política regional.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Boas palavras sobre educação

Uma das coisas que mais impressiona em qualquer discurso sobre educação em Portugal é a inexistência de teses contrárias à do «eduquês». Ainda que as teses construtivistas e românticas tenham muito a dizer sobre a educação, é pena quando as mesmas são transformadas em ideologia e em pensamento único. Qualquer tese só tem implicações reais quando sujeita à discussão pública. Este é um dos males que afecta também a investigação feita nas universidades portuguesas em matéria de educação. Praticamente só se olha um lado da realidade, como se não pudesse existir mais verdade para além da professada. É neste seguimento que fiquei admirado com as palavras de Paulo Rangel, político português, sobre a educação. São palavras desafiantes para aquilo que tem sido transformado como ideologia. E há que encarar com coragem a hipótese de que a escola do facilismo produz o resultado oposto ao esperado, isto é, não beneficia os alunos provenientes de meios culturalmente mais desfavorecidos. Não é retirando a esses alunos a possibilidade de aprenderem ciência, física, matemática, filosofia, história e substituindo essas disciplinas pela conversa fiada da cidadania e quejandos que tais que se contribui para a liberdade de conhecimento de todos. É que os mais ricos podem pagar para aprender o que realmente tem valor formativo, ao passo que os mais pobres ficam sem acesso ao conhecimento. Soube bem saber que há políticos que pelo menos vão tendo alguma coerência no discurso. Não me parece que seja da competência de um político saber sobre educação, mas vale sempre a pena ter alguma posição coerente e desafiante da ideologia mais comum.


Acho que houve um modelo de educação baseado no facilitismo e na ideia de que o aluno é o centro da educação. Ora, eu penso exactamente o contrário. Penso que a escola deve ser visto como um valor colectivo, é um centro de transmissão do saber, de transmissão geracional do saber. O que é fundamental na escola é exigência e rigor no ensino. Considero que é muito mais importante, por exemplo, o sistema de avaliação dos alunos e de qualidade do ensino do que o sistema de avaliação dos professores.Considero mais importante a questão da autoridade e da disciplina na escola do que a questão da carreira dos professores. E considero que isto é feito em nome de um projecto de igualdade de oportunidades, porque uma escola facilitista é a escola que protege as classes mais altas. Uma escola pública facilitista é a que mais favorece a estratificação social. Porque as classes mais baixas do ponto de vista sócio-cultural ou económico-cultural não têm outro sítio onde aprender além da escola – não têm colégios privados. Neste momento, eu diria que temos quase uma escola classista que, cada vez mais, aumenta o fosso entre as classes privilegiadas e as menos privilegiadas.

Paulo Rangel (Entrevista no Jornal I de 18/02/2010)

Simon Blackburn

Não sei ainda se é um livro novo ou uma reedição, mas ficou na minha booklist para breve.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

A sinfonia da ciência e da filosofia


“Projecto divulga ciência e filosofia através da música
Fonte: YouTube
O projecto "Symphony of Science" foi idealizado por John Boswell (músico) como veículo para fazer chegar o conhecimento a uma audiência habitualmente arredada da área científica. Há cerca de dois meses começou a colocar 'clips' no YouTube. Já ultrapassou o milhão de visitantes.”



sábado, 13 de fevereiro de 2010

Seremos todos filósofos mesmo sem o saber?


Estou a aproveitar algumas ideias de um dos nossos leitores, não como acto de provocação, mas porque penso realmente que o comentador está a tocar em alguns pontos que considero sensíveis à filosofia e que são criadoras de inúmeras confusões. E nesse sentido tenho uma palavra de gratidão ao nosso leitor por estar a usar os seus argumentos para testar algumas ideias comuns. Uma das ideias comuns a muita gente sobre a filosofia é esta:


Ser filósofo é intrínseco ao Homem, todo o homem procura a sabedoria.”



Mas nesse caso, ser cientista também é intrínseco ao homem, pois todo o homem deseja e procura saber. E também é intrínseco ao homem ser matemático, poeta, artista quem sabe? Mas se toda e qualquer actividade for conotada com um campo de saber, nesse caso é intrínseco ao homem ser carpinteiro, futebolista, internauta, astronauta, etc. Ou se temos um campo mais restrito sobre o que é a sabedoria, nesse caso só será intrínseco ao homem esse campo mais restrito. A minha opinião é que ser filósofo não é, de facto, intrínseco ao homem, nem acho que  todo o homem procure sabedoria como se isso lhe fosse tão intrínseco como respirar. Pelo contrário penso que a maioria dos seres humanos se estão completamente nas tintas para a sabedoria, para melhor conhecer o universo e o que está à sua volta. E acho que só em momentos muito raros da história é que encontramos pessoas genuinamente interessadas na sabedoria. Por outro lado acho que temos tanta potencialidade para sermos filósofos como para passarmos a vida a beber cerveja e ver a bola. Depende da forma como cada um é estimulado e se estimula para a filosofia. A maioria das pessoas que conheci no curso de licenciatura em filosofia passaram por uma oportunidade para saberem mais de filosofia, ciência, história, etc. e curiosamente muito poucos tinham um genuíno interesse nisso. Para mim é falso que os seres humanos tenham uma curiosidade intelectual nata e que só por isso possam ser filósofos. Na minha opinião ser filósofo, como ser cientista, como ser historiador, etc. envolve um grande trabalho e pessoas com menos talento, mas mais paixão pelo trabalho podem filosofar mais e melhor que outras com mais talento mas com menos trabalho. Ora, isto contraria um dos argumentos do comentador que refere precisamente que um qualquer pastor a rezar pode ser mais filósofo que um doutor cheio de cursos e pós graduações.
Mas é curioso o comum que é as pessoas pensarem que todos somos filósofos. Não o fazem com a mesma facilidade para os matemáticos ou para os físicos ou biólogos. Este argumento aplicado, por exemplo, para a biologia não é nada pacífico:


“ser biólogo é intrínseco ao homem. Todo o homem procura sabedoria”


Ao mesmo tempo este tipo de argumentos parecem denunciar uma ideia negativa do que é estudar filosofia nas universidades. Parece que estudar filosofia nas universidades é sair de lá com dezenas de livros decorados e um mestre na citação de filosofias. Isso realmente acontece. Mas aqui há que saber distinguir as boas das más universidades e os bons dos maus cursos de filosofia. Existem universidades em todo o mundo. E em quase todas elas se estuda filosofia. E, talvez infelizmente, não será expectável que todas elas tenham excelentes cursos de filosofia. Basta por os olhos na universidade portuguesa para perceber que os cursos de filosofia em Portugal não produzem filosofia. Nunca saiu um filósofo relevante dos cursos de filosofia portugueses. E sempre foi assim. Deste modo, quem  só conhece esta realidade tem a tendência a pensar que afinal o filósofo nada tem a ver com a universidade, que a universidade só forma uma data de tipos com manias de intelectuais mas que não sabem pensar. Isso é, como já disse, verdadeiro se aplicado a um caso como o português. Mas será que um australiano pensa assim quando os seus melhores e maiores filósofos, conhecidos mundialmente e discutidos pelos melhores filósofos, como Peter Singer ou David Chalmers, foram formados nas suas universidades? Estou convencido que não.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Vamos discutir para aprender


Um leitor fez a seguinte afirmação nas caixas de comentários do FES:



 pode ser muito mais filósofo um pastor iletrado que todos os domingos se ajoelhe perante um Deus, que muitos doutores.”


Parece claro que para pensar basta, de facto, uma cabeça a raciocinar. Mas será a afirmação do leitor verdadeira? Será que a rezar perante deus temos a possibilidade de filosofar mais que alguém que dedica grande parte da sua vida a aprender e discutir os argumentos dos filósofos? E se pensarmos no futebol, será que se pode ser mais futebolista rezando a deus do que ser jogador profissional da selecção nacional? Que pensa o leitor disto?

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Será uma crença verdadeira conhecimento?

Um aspecto muito comum para muitas pessoas consiste em pensar que um crença verdadeira é conhecimento. Acontece com imensa frequência em conversas esse aspecto. Mas será a crença verdadeira conhecimento? Esta foi uma questão sobre o conhecimento muito debatida – e ainda é – entre os filósofos. Vamos supor um exemplo simples. Estamos numa corrida de cavalos e eu aposto no cavalo x alegando que sei que vai ganhar. Acontece que o cavalo x é mesmo o vencedor da corrida. A minha crença é verdadeira. Mas será a minha crença conhecimento? Compreender a diferença entre crença verdadeira e conhecimento permite-nos, pelo menos, distinguir as conversas infundadas das fundadas.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Filosofia da ciência

Temos agora, felizmente, disponível a tradução da conferência TED de David Deutsch, “Uma nova maneira de explicar a explicação”, traduzida por Desidério Murcho e disponível na Crítica. Trata-se de um lúcido texto que clarifica algumas confusões do papel das explicações científicas. Deixo um parágrafo para abrir o apetite:

Contudo, o que tanto os criacionistas quanto os empiristas ignoram é que, nesse sentido, também ninguém viu alguma vez uma Bíblia. O olho só detecta luz, que não percepcionamos. Os cérebros só detectam impulsos nervosos. E nem sequer os percepcionam como realmente são: nomeadamente, crepitações eléctricas. Não percepcionamos coisa alguma como realmente é. A nossa conexão com a realidade nunca é apenas percepção. Está sempre, como dizia Karl Popper, impregnada de teoria. O conhecimento científico não é derivado de coisa alguma. Como todo o conhecimento, é conjectural. Testado pela observação e não derivado dela.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

ZarcoScripts

O meu aluno do 12º ano, Manuel Gallego, elaborou um interessante blog para expor o seu trabalho no âmbito da Área de Projecto. Para além disso deixo também aqui o convite para as sessões a realizar pelo Manuel, como se pode ver no cartaz abaixo.