sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Como é que ensino filosofia? Parte 1


Vou dar início a uma série de pequenos posts onde tentarei mostrar como ensino filosofia no ensino secundário. Vou postando por partes. Esta primeira parte obedece a um trabalho ainda prévio à leccionação propriamente dita. Espero que este trabalho ajude os colegas que visitam o blog.



Portfólio – trabalho prévio



Praticamente no início de mais um ano lectivo, ainda que esteja a gozar os últimos dias das férias, aproveito para organizar o portfólio para o próximo ano, subdividido em várias secções. Desde já, a primeira dificuldade é não saber com que anos e turmas vou trabalhar. Esse trabalho, provavelmente o mais importante de todos, muitas das vezes acaba a ser feito em cima da hora, com as imperfeições naturais que daí decorrem. Para o portfólio utilizo uma daquelas pastas da Ambar com micas agregadas. Lá coloco, numa ordem que já uso há uns anos, horário do professor (deixo uma mica vazia até o ter em mãos), os critérios de avaliação, turmas e grelhas de classificação, textos e materiais extra e um plano prévio de actividades (normalmente de continuação já que ando há uns anitos na mesma escola). Na qualidade de delegado de grupo, uma das propostas que fiz inicialmente ao grupo foi a de fazer planificações que coubessem no máximo em duas folhas. Assim é de fácil consulta e andamos com as planificações sempre à mão. Planificações de 15 páginas significa que são arquivadas e nunca mais ninguém olha para o documento. A portabilidade foi um dos critérios que o meu grupo de trabalho adoptou.

Uso o portfólio em versão digital e imprimo somente o material estritamente necessário para andar comigo dentro da pasta no portfólio fisíco. Estes portfolios da Ambar tem a vantagem de terem no interior da capa dois lugares para cd. Isso permite-me, no final de cada ano, gravar tudo em cd e arquivar. Não se espere daqui que tudo esteja na sua organização perfeita. Não existem métodos ideais e durante o ano são muitos os documentos que vou acumulando, de modo que passado uns anos trabalhar com o portfólio nem sempre é tarefa fácil. E com a burocracia cada vez maior nas escolas, ainda mais complicado é. Por essa razão também mando muita coisa para o lixo, ainda que tenha sempre receio de enviar para o lixo material que possa vir a fazer falta.

Como tenho alguma prática de ensino neste momento não estou ainda a trabalhar directamente nos programas já que nem sei bem quais os anos e turmas que vou leccionar. Esta tarefa é tanto mais complicada quanto menos anos de ensino temos e é um erro que as escolas deviam ter a preocupação de corrigir. Claro que muitos professores só querem saber do horário cedo para reclamar que queriam esta ou aquela tarde livre, mas cada vez mais os professores necessitam dos horários atempadamente para aproveitar a primeira semana de Setembro para preparar os programas. Se, por exemplo, me couber em má sorte leccionar Psicologia A ou B, terei de passar um fim de semana inteiro a preparar a primeira unidade já que nunca leccionei esses conteúdos. E isto porque os horários são entregues aos professores pouco tempo antes do ano arrancar. No ano seguinte ao meu estágio fui parar a uma cidade distante do interior do país e entregaram-me um horário com filosofia do 10º ano, 11º e Psicologia e pediram para começar a trabalhar nesse mesmo dia. Nunca tinha leccionado Psicologia na vida. No ano seguinte fui parar a uma Vila do interior e apresentei-me na escola às 9h da manhã e meia hora depois estava já dentro de uma sala de aula. Assim é mais complicado realizar o trabalho prévio de estudar os programas, preparar as aulas a partir do manual, etc. isto para já não referir a probabilidade de termos um mau manual adoptado e nesse caso ter de fazer um autêntico trabalho de pesquisa, corte e costura ao longo do ano lectivo. Fazer isto para 3 disciplinas diferentes (em muitos casos é mais) é uma tarefa complexa e uma circunstância conhecida só por quem está bem por dentro da realidade que é uma escola, os professores.

Este é o trabalho que ando a realizar neste momento, portanto toda a gente já sabe o que ando a fazer. Os passos que seguem é o que irei fazer a seguir ao portfólio. Nada disto, entretanto, tem muito a ver com ensinar filosofia, mas mais com o ensinar em geral. Mas sem este trabalho prévio, mais ou menos elaborado, é impossível chegar a uma sala de aula. Esta é também uma parte importante do que aprendem a fazer os futuros professores nos estágios. Com a experiência este trabalho torna-se mais organizado, mais fácil de fazer. É mais fácil pois já temos um conjunto de materiais organizados e temos também experiência. Mas este trabalho é enorme para um professor nos primeiros anos de profissão que anda de terra em terra com a casa às costas e é obrigado a mudar de escola vezes sem conta. É que cada escola tem os seus métodos de trabalho próprios. Há escolas mais burocráticas, outras menos, grupos de trabalho mais activos e outros menos. Para além disso existe a mania de empurrar todo o trabalho burocrático para os mais novos (também já fui vitima disso) e, como tal, quanto menos anos de serviço tem um professor, mais embaraçado pode ficar com os inícios de anos lectivos. Resta ainda dizer, pelo menos para os leitores não professores, que 90% se não mesmo 100% deste trabalho é realizado em casa, razão pela qual a sala do meu T2 está transformada numa biblioteca / escritório.

2 comentários:

Domingos Faria disse...

Boa ideia! Estes post's são úteis...

Rolando Almeida disse...

Olá Domingos,
Mais que tudo é uma tentativa de cooperação. A ideia é sempre a mesma, criar espaços de partilha. Uma ideia é colocar um post com um convite a todos os autores de blogs de filosofia fazerem o mesmo.
abraço